O presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou nesta quarta-feira decreto que formaliza a adoção de uma meta contínua de inflação a partir de 2025, prevendo que o Banco Central deverá se explicar ao governo se o alvo for descumprido por seis meses consecutivos.
O novo sistema para substituir o modelo atual de busca pela meta em cada ano-calendário foi normatizado um ano após o anúncio de sua adoção pelo governo.
A aguardada regulamentação, com detalhes sobre a dinâmica do novo modelo, foi publicada no Diário Oficial da União nesta quarta.
De acordo com a medida, a meta será representada por variações acumuladas da inflação em 12 meses, apuradas mês a mês.
A partir de 1º de janeiro de 2025, será considerado que a meta foi descumprida quando essa inflação acumulada se desviar por seis meses consecutivos da faixa do intervalo de tolerância.
A meta e o intervalo de tolerância continuarão sendo fixados pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que manterá o alvo em 3%, com margem de 1,5 ponto para mais ou para menos, segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
De acordo com o Ministério da Fazenda, a fixação da meta não será mais feita a cada ano, com o alvo passando a ser definido para o longo prazo. A pasta ressaltou que eventual mudança na meta seguirá passando pelo crivo do CMN e deverá respeitar uma antecedência mínima de três anos para início de sua aplicação.
O decreto também define que a partir de 2025, o BC divulgará trimestralmente no Relatório de Política Monetária substituto do Relatório Trimestral de Inflação o desempenho da nova sistemática de meta, os resultados das decisões passadas de política monetária e a avaliação prospectiva da inflação.
Em caso de descumprimento, o BC divulgará publicamente as razões do ocorrido no Relatório de Política Monetária e em carta aberta ao Ministro da Fazenda, com a descrição detalhada das causas, as medidas necessárias para assegurar o retorno da inflação aos limites estabelecidos e o prazo esperado para que as medidas produzam efeito.
Novo Horizonte
Em entrevista à imprensa, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que os termos do decreto que instituiu a meta contínua foram negociados com toda a área econômica, incluindo o Banco Central, defendendo que esse “é o melhor decreto que nós podemos oferecer ao país”.
“A questão está absolutamente consolidada e eu acredito que, com o arcabouço fiscal de um lado e o decreto da meta contínua do outro, estabelece, tanto do ponto de vista fiscal quanto do ponto de do ponto de vista da política monetária, um novo horizonte macroeconômico para o Brasil”, disse.
Na entrevista, o ministro disse que o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, tendo sido autorizado pelo presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, esteve em reunião com Lula nesta semana para esclarecer pontos do decreto.
Segundo ele, Galípolo que é considerado cotado para a presidência do BC era o diretor responsável por analisar a meta contínua.
A jornalistas, Lula afirmou nesta quarta que “ama” inflação baixa e que a meta de inflação é um número a ser perseguido, ressaltando que o governo vai trabalhar para levar o índice de preços ao alvo, com 1,5 ponto para mais ou para menos.
A mudança na sistemática da meta acontece 25 anos depois de o CMN ter estabelecido, pela primeira vez, uma meta de inflação a ser perseguida pelo BC. Em resolução de junho de 1999, o CMN definiu o sistema, dando início ao chamado “regime de metas”.
A adoção de uma meta contínua para a inflação, com manutenção do alvo central de 3%, vinha sendo tratada por diretores do BC como um aprimoramento do sistema e uma representação de ganho de credibilidade do regime.
O BC tem demonstrado preocupação com um processo contínuo de desancoragem das expectativas do mercado para a inflação, que têm se afastado do centro da meta mesmo diante de dados benignos na inflação corrente.
O mais recente boletim Focus do BC, que capta projeções de mercado, apontou para uma inflação de 3,85% em 2025, atual foco da política monetária, já que alterações nos juros básicos geram efeito defasado na economia. Um mês antes, a estimativa estava em 3,75%.
Em nota à imprensa, o Ministério da Fazenda afirmou que os ajustes implementados pelo novo sistema devem reduzir incertezas e permitir uma ancoragem das expectativas de inflação em horizontes mais longos.
A pasta disse que a decisão de manter a meta de 3%, similar ao patamar praticado em outros países emergentes, fortalece a percepção de compromisso do Brasil com inflação baixa e estável.
O ministério também argumentou que a mudança de horizonte para cumprimento da meta ainda permite retirar a sazonalidade das decisões de política monetária e afastar medidas que busquem forçar mudanças artificiais de preços.
“Com a mudança, deixam de existir estímulos para implementar políticas que levem à desaceleração “artificial” da inflação à medida que o fim do ano se aproxime, apenas para garantir cumprimento da meta”, afirmou.