O diretor de Política Econômica do Banco Central, Diogo Guillen, disse que a cúpula da autarquia tem debatido muito o dinamismo da atividade doméstica. Ele apresentou detalhes sobre o tema durante live promovida pela Bradesco Asset sobre os potenciais impactos da política monetária na conjuntura macroeconômica de 2025. A conversa é conduzida pelo economista-chefe da instituição financeira, Marcelo Toledo.
Guillen salientou que o Produto Interno Bruto (PIB) tem apresentado um crescimento mais forte do que durante o período pré-pandemia. “Essa é a primeira história de um crescimento forte. O segundo é a surpresa. Então, não só cresceu, como surpreendeu”, considerou.
Essas surpresas, de acordo com ele, levaram a revisões das projeções na Focus para 2022, 2023 e 2024. “E é por isso que a gente se debruça tanto sobre quais são os motivos dessa resignação”, justificou.
Outro ponto importante, conforme o diretor, é que em 2023, quando se olhava a abertura do PIB, o crescimento vinha mais dos setores não cíclicos, como o agropecuário. Isso explicou muito do primeiro trimestre daquele ano, mas em 2024 foi o oposto.
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A partir daí, continuou Guillen, o BC trouxe em sua comunicação avaliações sobre o consumo e o investimento mais forte. O consumo, enfatizou, vinha mostrando um crescimento próximo ao do PIB e agora cresce até além do próprio PIB. “Mas quando a gente faz uma análise histórica mais longa, fazendo a formação bruta em relação ao PIB, ainda abaixo da média histórica”, pontuou.
Ao olhar a atividade mais na ponta, segundo o diretor, é possível verificar que os dados sobre as vendas no varejo e a produção industrial estão um pouquinho mais fracas. Mas é preciso observar, de acordo com ele, se são situações de oscilação ou a formação de uma tendência.
Sobre o mercado de trabalho, Guillen destacou que a taxa de desocupação é impressionante e está indo para a mínima histórica, algo inesperado. “Foi forte e surpreendeu e com uma dificuldade muito grande de entender qual é o equilíbrio desse mercado de trabalho”, disse.
Salários
Dada essa surpresa, segundo ele, é preciso entender quanto disso é estrutural e quanto é conjuntural. “O jeito que a gente procurou tratar, uma vez que você tem essa dificuldade tão grande de entender estruturalmente qual é o mercado de trabalho, é olhar um pouco os salários. No fim, o salário vai refletir a pressão do mercado de trabalho. Então, se é difícil estimar essa Nairu por causa da reforma, por causa da pandemia, vamos olhar os rendimentos. O que aconteceu com os rendimentos, eu acho que na virada do ano de 2023 para 2024, a gente começou a ver uma aceleração dos rendimentos”, relatou.
Esse quadro, junto com outros fatores, levou o BC a ir mudando um pouco a comunicação e a forma como se enxergava a política monetária, de acordo com o diretor. Foi nesse momento que houve o processo de interrupção do ciclo de corte de juros.
“E aí, acho que foi mudando para um cenário de rendimentos mais forte, a gente discutindo quando ia bater na inflação, a gente dando um pouco mais de ênfase a essas métricas de inflação ligadas a mercado de trabalho”, citou, explicando que passou-se a ver mais pressão na inflação dos serviços, na inflação ligada ao mercado de trabalho. Na ponta, de acordo com ele, o rendimento médio real do trabalho está crescendo de forma mais moderada.
Política monetária heterogênea
Guillen avaliou que o cenário tem mostrado bastante resiliência da atividade externa. “Talvez uma das principais características do cenário externo tem sido a resiliência da atividade”, afirmou Guillen.
O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de vários países, de acordo com ele, está relativamente estável, apesar de uma política monetária que se mostrou contracionista e que agora sofre cortes. “É um cenário bem resiliente de crescimento do PIB “
Sobre o mercado de trabalho nos Estados Unidos, a questão, conforme o diretor, é se o ajuste vai se dar via oferta ou via demanda. Por enquanto, de acordo com ele, o cenário é bem benigno no mercado de trabalho nos Estados Unidos. “Claro, fica o debate sobre qual é a velocidade desse ajuste no mercado de trabalho: se vai trazer a desinflação que se almeja, mas bem benigno”, considerou.
Guillen voltou a comentar sobre o processo de desinflação em dois estágios no mundo. O primeiro momento seria o de uma diminuição “mais barata”, que não precisa de tanta abertura de hiato. A partir de 2022, de acordo com ele, em vários países houve um processo de normalização de cadeias, com os preços administrados mais baixos, e aí um segundo estágio que é mais resiliente.
“Nesse segundo estágio e com a resiliência da inflação, começa também a ter maior diferenciação entre países. Eu acho que a gente está nesse processo de política monetária mais heterogênea, seja no ritmo com que vai se dar essa queda de juros ou até uma interrupção na queda de juros, no nosso caso, um ciclo de uma política monetária distinta em função dos elementos idiossincráticos”, comentou.
O diretor salientou que o cenário global, que era marcado por um choque correlacionado e que era ligado à pandemia de covid-19, agora mostra a prevalência das respostas dadas e da atuação da política monetária. Olhando para a política monetária, há um processo de corte de juros em vários países, mas não no caso brasileiro. “No caso do Brasil, a expectativa, por exemplo, de juros para 2025 é acima do que foi o pico desde a covid, que acho que é um debate que a gente vai ter aqui sobre esse ciclo de elevação de juros”, considerou.
Federal Reserve
O diretor disse que há dúvidas sobre a postura do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), principalmente depois da eleição de Donald Trump, já que há incertezas sobre a política econômica que o novo presidente americano adotará.
Para Guillen, o ambiente externo permanece desafiador. “Acho que os mercados têm refletido um pouco desse nosso debate sobre como é que vai se dar essa queda de juros nos Estados Unidos, com os dados de mercado de trabalho resilientes”, disse, acrescentando que há um monitoramento sobre como vai se dar o processo de desinflação.
“Acho que tem muita incerteza em função das políticas que o governo Trump pode adotar, seja para a imigração, como é que vai ser o fiscal, se tudo pode ter impacto sobre inflação e consequentemente sobre o Fed”, citou.
O segundo ponto apresentado pelo diretor diz respeito a como os bancos centrais das principais economias estão determinados nesse processo de convergência. “Acho que deixou de ser um grande assunto mais recente, mas a gente já falou bastante sobre isso”, considerou.
Para uma redução da inflação no Brasil, conforme Guillen, é mais importante a redução da inflação nos outros países, já que um câmbio mais depreciado pode atrapalhar a inflação.
“A gente acha que mais importante é esse ambiente de inflação mais baixo globalmente, essa determinação dos países desenvolvidos em trazer a inflação para as metas num cenário em que você vê o primeiro momento de inflação caindo e agora uma resiliência maior em vários países.”