Você pode estar pensando: “De novo falar da poupança?”. O assunto é importante, tem preocupado os leitores e a solução agora é oficial. O governo divulgou as alterações que serão feitas na caderneta de poupança. Tecnicamente, as alterações terão pouco impacto na economia, pois abrangem um contingente muito pequeno de investidores, ficando muito mais nítido que o assunto foi politizado e o país perdeu uma grande oportunidade de avançar mais em um assunto tão importante.
Felizmente, aqui no Dinheirama o tema foi muito bem discutido, sendo até pauta do programa Futura Dinheiro – realizado pela rádio Futura FM 106,9 e que conta semanalmente com a presença do Navarro falando sobre economia, finanças pessoais e educação financeira. Seu último artigo, “A poupança e os hábitos financeiros do brasileiro” traz uma das edições que já tratou da caderneta e das voltas que o assunto deu.
Caderneta de poupança com Imposto de Renda
O que interessa é frisar a informação anunciada hoje de que as cadernetas de poupança com saldo acima de R$ 50 mil vão passar a pagar Imposto de Renda a partir de 2010. O imposto só será cobrado se a taxa básica de juros (Selic) cair abaixo de 10,5%. Lembrando que hoje a taxa está em 10,25% ao ano e a tendência apontada pelo mercado é de que até o final do ano ela esteja entre 9,5% e 8,5%.
A proposta do governo é taxar quem mantiver mais de R$ 50 mil em poupança de acordo com a variação da Taxa Selic. O quadro abaixo mostra uma tabela progressiva e auxiliará o entendimento da nova medida:
Exemplo: imagine que o investidor tenha uma aplicação R$ 60 mil na poupança e que a taxa Selic esteja fixada em 9% ao ano. Diante dos critérios estabelecidos pela nova regra, esse investidor terá de recolher 30% de Imposto de Renda sobre os rendimentos da diferença do aplicado para os R$ 50 mil do teto. Ou seja, neste exemplo existiria cobrança de IR sobre os ganhos de R$ 10 mil no período. De acordo com as palavras do ministro da Economia, Guido Mantega, o acerto com o Leão será feito no momento da entrega da Declaração de Ajuste Anual.
Se a poupança for a única renda (rentabilidade a partir do investimento) da pessoa, haverá isenção de imposto até R$ 850 mil. Para esses casos, o IR só será cobrado acima desse valor. Mesmo assim, o imposto ainda será menor que o de outras aplicações.
Governo também reduzirá Imposto de Renda cobrado em fundos de investimento
Ainda no campo das notícias importantes, o governo também anunciou que reduzirá o IR cobrado dos fundos de investimento. É uma medida que visa complementar a taxação da caderneta de poupança de forma que os investidores possam ver os fundos e a gestão especializada como opções ainda interessantes frente aos rendimentos da caderneta.
A conta do governo mostra que se a taxa básica de juros (Selic) cair de 10,25% ao ano para 9,25% ao ano, o IR sobre os fundos terá de cair 7,5 pontos percentuais, passando de uma alíquota máxima de 22,5% para 15%. “A redução [da alíquota] será graduada, de acordo com a queda da Selic”, disse hoje o ministro Mantega.
A mesma redução de IR concedida aos fundos será estendida para as aplicações com renda fixa, o que inclui também os chamados Certificados de Depósitos Bancários (CDB) e o agora combalido Tesouro Direto. De uma forma técnica, a medida provisória que será publicada em breve trata a renuncia fiscal como um desconto. Isso permite uma maior facilidade ao governo caso a tendência de baixa na Selic se reverta. E, claro, não assusta o pequeno poupador (eleitor) às vésperas da eleição.
Resumo da ópera
Fica a sensação de que poderíamos ter avançado mais. Para um país com uma economia estável, em desenvolvimento, ter uma aplicação nos moldes de caderneta de poupança (com rendimento garantido de 6% ao ano mínimo garantido) não parece ser muito inteligente. Veja, estou falando como alguém que pensa no futuro da nação – não encarem como crítica pessoal à caderneta de poupança ou ao ato de poupar.
É bem verdade que a elevada carga tributária e as altas taxas de administração dos bancos são grandes obstáculos aos pequenos investidores. Justamente por isso, apenas 1% ou menos dos poupadores da caderneta serão atingidos pelas mudanças oficializadas hoje. A verdade nua e crua é que o brasileiro ainda poupa pouco e para grande maioria das pessoas falar em fundos de investimento soa como hipocrisia.
Nosso grande desafio é criar uma sociedade que ao final do mês consiga ver a conta no azul, totalmente diferente dos atuais valores “emprestados” do cheque especial, cujos juros andam em percentuais absurdos – e para os quais o governo parece não ligar. Pra frente Brasil, porque atrás vem gente. Pra frente poupador, porque o futuro chega rápido demais.
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Ricardo Pereira é educador financeiro e palestrante, trabalhou no Banco de Investimentos Credit Suisse First Boston e edita a seção de Economia do Dinheirama.
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