Juros, juros e mais juros. Começo o texto pelo básico, buscando uma definição para o juro. Vou me valer do que está escrito no dicionário “Melhoramentos da Língua Portuguesa”, que o define como “a remuneração que uma pessoa recebe pela aplicação do seu capital; rendimento de dinheiro aplicado”. Dessa maneira, e pensando em uma aspecto temporal, tudo que traz prazo tem, de uma forma ou de outra, juros envolvidos. Sempre alguém paga juros e sempre alguém recebe juros.
Por que os Juros no Brasil são tão altos?
Minha intenção era chegar a essa definição no final, mas é através da explicação dos juros altos que chegaremos, juntos, naquilo que é o mais lógico e visível em se tratando de Brasil: as conseqüências dos altos juros. Primeiro, precisamos entender que as instituições financeiras (bancos) dos outros países também lucram (muito) ao emprestar dinheiro aos seus clientes, ainda que usando taxas de juros bem mais baixas que as praticadas por nossas instituições. Dito isso, não cabe somente aos bancos a culpa pelas altas taxas praticadas. Vejamos um pouco mais sobre a tal “culpa”.
O Governo. Desde que me conheço por gente, o Brasil sempre possuiu grandes problemas no campo econômico. Vivenciei o período de hiperinflação que, com o advento do Plano Real, acabou sendo superado. Entretanto, essa época foi marcada, entre outras coisas, por uma moratória da dívida externa. Isso você já sabia, certo? Qual a relação com os juros? Ora, coloque-se no lugar do FMI e de outros credores que tiveram seus débitos encerrados, unilateralmente, do dia para a noite. Dílson Funaro resolveu dar um calote com “C” maiúsculo.
Hoje em dia, uma atitude como essa acabaria resultando numa crise de maiores proporções, graças à chamada Globalização. Voltando ao X da questão, com o calote o Brasil passou por uma crise de confiabilidade. Ainda assim, o Brasil continuou precisando de dinheiro e, com a maior cara-de-pau, recorreu aos organismos internacionais de crédito para solicitar novos empréstimos. Esse ciclo criou no país uma deficiência muito grande de capital interno, com pouca entrada de dinheiro, e falta de investimentos. Calma, o economês vai acabar já já.
A falta de dinheiro, sobretudo de investimentos internacionais, foi um dos responsáveis pela hiperinflação. Todos sabem que os Bancos Centrais tem como missão o combate à inflação, e durante todo esse tempo as altas taxas de juros foram as principais armas utilizadas para tentar combater esse crescente poder inflacionário. Viu? Os juros altos têm explicaçao sim. Vale lembrar que o governo ostenta um gigantesco déficit público e usa das altas taxas de juros dos empréstimos para arrecadar fundos para cobrir os empréstimos tomados lá fora. Ops, chega de economês!
O cidadão comum. Tal qual o governo brasileiro que se utilizou da chamada moratória, o consumidor brasileiro dos produtos bancários (empréstimos, financiamentos, etc.) tem um histórico bastante peculiar e até justificável de inadimplência, o que encarece o capital e aumenta o risco de crédito. Existe aí um ciclo vicioso: juros altos, inadimplência, juros altos.
É verdade que, nos últimos anos, conseguimos novas modalidades de financiamentos. O empréstimo consignado, por exemplo, permite que o próprio salário seja uma garantia de recebimento para as instituições financeiras. Ainda assim, os juros continuam enormes e sacrificantes. Além do alto índice de inadimplência já mencionado, vale ressaltar a grande passividade do consumidor brasileiro. Falta uma melhor cultura financeira, que começa na educação de nossas crianças.
Quantos são os que enveredam pelos labirintos dos cartões rotativos, cheques especiais, sem ao mínimo saber o que é um empréstimo consignado? O banco ganha, na maioria das vezes, por nossa total falta de conhecimento, nossa ignorância financeira. Sem conhecermos o produto, não discutiremos corretamente as taxas nele embutidas.
As conseqüências dos juros altos
A tendência de queda dos juros apenas será possível se o governo reduzir os gastos e passar a gerar mais fontes de renda para a redução do caos interno e da dívida pública. Ter uma das maiores taxas de juros do planeta dificulta, e muito, a situação econômica de um país, afinal, os juros altos nada mais são do que o custo do dinheiro.
Se baixarem os juros, haverá o retorno da hiperinflação, baseada no amento da demanda?
Acho que não. A taxa básica do Banco Central, a Selic, recai sobre o dinheiro em circulação, que não é poupança, já que não fica indisponível por nenhum prazo. Qualquer um, a qualquer momento, pode sacar (não deixem a Zélia ouvir isso). É o dinheiro que circula, que faz a economia girar.
Como assim? Por que esse dinheiro rende juros?
A lógica diz que, pagando os juros, o Banco Central evita que os donos dessa moeda venham a gastá-la ou emprestá-la para que os outros a gastem. Dessa forma, age de forma a retrair o consumo, o investimento e a produção. Perceba, isso é um vai-e-vém danado, é economês desnecessário. Por trás das justificativas mil, a grande verdade é que o Banco Central mantém as taxas de juros nesse patamar por razões cambiais. De forma simplista, tem medo que, ao baixá-las, os estrangeiros que especulam no Brasil, atraídos justamente pelas altas taxas, fujam do país.
O que fazer?
Acredito que o Banco Central exagera na quantificação dos juros. É excesso de “monetarismo”, num país que precisa se desenvolver. É a velha questão da linha tênue existente entre o remédio e o veneno. A conscientização popular através da educação financeira pessoal é um instrumento importante, pois só assim as pessoas poderão questionar os bancos e procurar modalidades mais inteligentes de investimento, tendo real poder de discutir, com seus gerentes e gestores, taxas reais mais interessantes. Saberão, de forma definitiva, o real valor daquilo que estão comprando e financiando.
Os 4 P’s!
Enquanto os juros não abaixam, podemos utilizar a regra básica dos 4 P’s: Planejar, Pesquisar, Pechinchar e Pagar a vista. Fica o meu incentivo ao gasto consciente e inteligente. Procure aquilo que é bom para o seu bolso, valorize seu conhecimento de economia. Navarro, muito obrigado pelo espaço e oportunidade. Até a próxima.
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Ricardo Pereira é Analista Financeiro Sênior, trabalhou no Banco de Investimentos Credit Suisse First Boston Garantia e passa a integrar a equipe de editores de Economia do Dinheirama. Seja bem vindo Ricardo.