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Tijolo sobre tijolo: Com a Selic em queda, há FIIs ganhadores e perdedores?

Investidores precisam compreender a dinâmica da relação dos preços das cotas com os níveis de taxas de juros

por Ricardo Figueiredo
3 min leitura
Fundos Imobiliários

Às segundas, quartas e sextas-feiras, tenho por hábito abrir a caixinha de perguntas para meus seguidores no Instagram. Ainda não me segue? Lá, sou o @ricardo.fiis e espero te ver na próxima oportunidade.

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Recentemente, tão certo quanto respirar é condição sine qua non para viver, é o fato de que, ao abrir a caixinha, é saber que as perguntas “quais FIIs (setores) serão mais beneficiados com a queda da taxa Selic?” e “quais serão mais prejudicados com a redução?”, além de suas variações nessa linha, aparecem – isso mesmo, no plural!

Vamos fatiar esse boi em bifes porque, por mais que as pessoas gostem de soluções fáceis, elas só existem em casos de questões igualmente fáceis, e esse não é o caso.

Fundos imobiliários de diferentes tipos (tijolo, papel e FoF-FII) reagem de diferentes maneiras, ainda que por vezes o ponto de chegada seja similar. Mesmo que todos os caminhos levem à Roma, é bem-vindo o ato de desmistificar cada rota traçada pelo GPS.

Comecemos por aqueles que certamente são a maior fonte de preocupação dos questionadores em minha rede social: os FIIs de papel.

As perguntas para esse grupo já partem do pressuposto de que, com o vindouro ciclo de corte de juros, os preços das cotas desses FIIs vão cair. Eu disse que iríamos fatiar o boi (FIIs) em bifes (tipos), mas se necessário, o bife também será fatiado, e para fundos de papel, sim, será necessário dividir em dois “bifinhos”.

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Sobre os fundos de papel com indexação predominante em CDI: no vértice do rendimento, não tem milagre. Para uma mesma carteira de CRIs, se o indexador cai, a remuneração também cai, todo o restante mais do que constante. Como o CDI é uma taxa diária, o impacto inclusive será refletido mais rapidamente no rendimento do que a velocidade em comparação à repercussão do que ocorre nos fundos de papel com indexação à inflação quando das oscilações do índice inflacionário de referência.

Falando em tais FIIs, nos fundos de papel com indexador predominante de inflação (IPCA ou IGP-M), não há nexo causal direto para justificar que queda de juros promova diminuição ou aumento do rendimento.

O dividendo nesse segundo grupo reage ao sabor do dado de inflação. Mas para ambos, há possibilidade de efeito positivo como reflexo do ciclo de corte de juros. No vértice de valor patrimonial, a redução de taxa de juros cria o cenário de reprecificação positiva para tais FIIs, uma vez que investidores e investidoras tendem a diminuir o prêmio de risco e/ou nível de rendimento desejado para investir em FIIs. Isso abre espaço para o efeito da compressão de cap, ou seja, para um mesmo patamar de renda gerada, a menor exigência de renda permite que a pessoa aceite pagar um valor mais elevado pelo ativo.

Além disso, fundo com carteira de CRI atrelada à inflação pode ver seu valor justo ser majorado, uma vez que, em cenário de menor nível de risco e menores taxas de juros, tais fluxos podem ser precificados a taxas menores e isso gera um valor presente mais elevado, tudo mais do que constante em especial no perfil de risco do devedor.

Já observamos isso com a recuperação do valor patrimonial de alguns FIIs do setor nos últimos meses quando os juros futuros recuaram com a expectativa de corte na taxa Selic. A materialização de tal ajuste permitirá uma continuidade desse efeito no juro de longo prazo e ecoará de forma positiva no valor patrimonial de tais FIIs.

Para FIIs de tijolos, na ponta do aluguel, contratos são corrigidos pela inflação (IPCA ou IGP-M), e, no vencimento, renegociados para extensão de acordo com condições do mercado naquele instante. Logo, redução de juros não tem efeito direito sobre a renda de tais FIIs.

Porém, sobre o valor das cotas, aí, sim, temos impacto positivo. Como vimos, a exigência de retorno sobre a renda tende a diminuir se estamos em cenário com taxa de juros mais baixa. Portanto, investidores topariam pagar mais para receber um mesmo fluxo de renda.

XPML11

Como exemplos são didáticos e bem-vindos, vamos lá! Ao longo de 2019, o XPML11, FII de shopping gestão XP Asset, distribuiu renda que conferiu em média 0,49% a.m. considerando sempre o preço da cota no fechamento do dia do anúncio do rendimento. Ao longo do mesmo ano, a cota patrimonial de fechamento de mês do FII esteve com ágio médio de 10%. Ali, tínhamos uma taxa Selic que abriu o ano em 6,50% a.a. e fechou 2019 em 4,5% a.a.

Considerando os dados dos primeiros sete meses de 2023, com taxa Selic parada em 13,75% a.a., ainda que tenhamos clareza de início de movimento de queda ao longo do segundo semestre, o XPML11 entregou rendimentos equivalentes a 0,81% a.m. e negociou ao par de seu valor patrimonial, considerando as mesmas metodologias usadas para auferir os valores em 2019.

Isso mostra como um mesmo fundo pode trabalhar com níveis diferentes de exigibilidade de renda por parte de seus investidores em diferentes cenários de juros. Nunca é demais ressaltar que o fluxo de renda do FII em ambos os períodos estava em linha com a expectativa de que os ativos tinham de geração de caixa, ou seja, não existia vacância e/ou inadimplência acima do patamar usual para o perfil do ativo que pudessem justificar a diferença.

Ainda temos o efeito sobre o valor patrimonial dos tijolos. Menor nível de taxa de juros longas, reais ou nominais, enseja na adoção de menores níveis de taxa de desconto nos modelos de fluxo de caixa descontado – tudo mais que constante para demais variáveis.

Veja este exemplo da valoração feita pela CBRE para o Shopping Mooca Plaza, ativo do HGBS11. Lembrando que o dado está aberto para acesso público, sendo parte do laudo de avaliação disponível no site do FII.

O avaliador atribui como valor justo para o imóvel R$ 910,5 milhões, ou seja, o centro da matriz de valores auferidos pelo método de fluxo de caixa descontado. Ele adotou então a taxa de desconto de 8,75% a.a. para o período explícito do fluxo e a taxa de 7,5% a.a. para a perpetuidade.

Se retirarmos apenas 50 pontos-base em cada taxa, ou seja, utilizando 8,25% no período explícito e 7% na perpetuidade, o mesmo fluxo de caixa geraria um valor justo para o imóvel 7,2% maior, ou seja, R$ 976,4 milhões.

Maior redução do patamar de taxa de desconto é igual a maior impacto positivo no valor justo a ser auferido pelo avaliador e, por conseguinte, maior o crescimento da cota patrimonial. E, mais uma vez, nem mesmo foi realizado ajuste positivo em premissas de crescimento de vendas, de aluguéis ou outras variáveis que impactem positivamente o fluxo do caixa do ativo.

Se o valor patrimonial pode reagir positivamente quando temos menor nível de juros, então é de se esperar que o valor de mercado acompanhe ao menos no direcional.

Se FIIs de papel e de tijolo têm cenários positivos com nível menor de juros na economia, FoF-FIIs não podem ir em direção oposta, afinal, sua carteira é formada justamente por FIIs de CRI e de tijolos, o seu valor patrimonial reflete o valor de mercado dos FIIs investidos e, mais uma vez, se investidores levarem a cota de mercado para a mesma direção da cota patrimonial, o caminho é notoriamente ascendente.

Respondendo à pergunta que deu título a esta newsletter: com a Selic em queda, há FIIs ganhadores e perdedores?

Vencedores? Os FIIs, com certeza!

Perdedores? Quem investe nesse mercado olhando apenas para DY, sem compreender a dinâmica da relação dos preços das cotas com os níveis de taxas de juros e como os movimentos de tais juros afetam o valor dos ativos.

Um grande abraço,

Ricardo Figueiredo

É analista CNPI, especialista em fundos imobiliários da Spiti. Bacharel em Economia com especialização em Mercados Financeiros e MBA em Gestão Financeira e Atuarial, começou a carreira como professor na área de tecnologia. Migrou para mercado financeiro, no qual atua há cerca de 20 anos. Entre 2003 e 2021, passou pela área de investimentos da Vivest, maior fundo de pensão de capital privado do país. Realizou análise e gestão de investimentos em imóveis e carteira de fundos imobiliários, que totalizavam mais de R$ 1,2 bilhão.

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