Medo. Tensão. Desespero. Pânico. Na Rússia, o índice Micex ativou o circuit breaker – dispositivo que interrompe as negociações na bolsa – após queda de 17,45%. No Brasil, o Ibovespa está diante do menor nível desde agosto do ano passado. No ano, estamos com desvalorização de pouco mais de 25%.
No mês, queda de cerca de 14%. Você perdeu muito dinheiro com os problemas recentes do mercado financeiro? Quais as suas estratégias para enfrentar crises como a que vivemos agora? De quem é a culpa?
O Lehman Brothers, quarto maior banco de investimentos dos EUA, pediu concordata ontem. O banco dos irmãos Lehman quebrou. Fotos de funcionários deixando a sede do banco com seus pertences em caixas e mochilas pipocam em jornais pelo mundo todo.
O pedido de concordata do banco, com ativos que somam US$ 639 bilhões, é o maior já registrado desde 1980, segundo noticiou a Bloomberg. O banco errou em sua estratégia de alocação de recursos? Exagerou na concessão de crédito?
Enquanto isso, o Merrill Lynch, terceiro maior banco de investimentos dos EUA, teve suas ações negociadas com o Bank of America a US$ 29,00 por papel, valor 70% mais alto que o preço de fechamento do dia 12 de setembro. Mais erros? A AIG (American International Group), terceira maior seguradora do mundo (a número um nos EUA), também quase sucumbiu. Pois é, a crise é feia e disso não há dúvida.
A crise da culpa
Aproveito a oportunidade para convidá-lo para uma reflexão: será que as crises, especialmente aquelas próprias de cada um de nós, não são fruto de nossos próprios atos e erros? A resposta óbvia é “sim, claro!”, mas explicá-la não é tão simples assim. As razões que anteciparam a crise internacional não são facilmente digeridas pela grande maioria da população, o que torna muito mais fácil o desespero pelo “depois” que o planejamento para o “sempre”.
O pânico geral já chegou por aqui. O sentimento de desespero tomou conta do Dinheirama. Desde domingo, são muitos os comentários e e-mails recheados de indignação, palavrões, mensagens de desrespeito e ofensas. O bom senso deu lugar ao terror. Por alguns instantes, me senti o culpado por todos os probemas financeiros de cada um dos muitos afetados pela crise. Felizmente, tal sensação passou rápido, bem rápido. Decidi publicar algo a respeito.
A crise do aprendizado
Também fui pego pelo furacão econômico que afeta o mundo. Mantenho posições compradas na Bovespa e também estou vendo derreter parte de meu patrimônio. Optei, depois de muito pensar e conjecturar, por não mexer nesta fatia de minha cesta de investimentos. Aliás, aproveitei a crise para reforçar alguns planos futuros. As razões são importantes e nos levam a algumas conclusões:
- Não depositei nas ações “as economias da minha vida”. 2007 foi um ano atípico, de retornos extraordinários na bolsa de valores, o que atraiu um sem número de investidores esperançosos e reféns do noticiário econômico. Por filosofia e principios, sempre disse que investir em ações deve ser uma atitude de longo prazo. Expliquei, com todas as manhas possíveis, que longo prazo é mais do que a maioria das pessoas pensa que é. Portanto, se você colocou suas economias na bolsa, só posso lamentar. Displiscência nunca combinou com investimento de risco e planejamento.
- O pouco que tenho está razoavelmente diversificado. Criam por ai uma lenda de que diversificar é ruim. O problema de se acreditar piamente em um suiço rico é a tentativa de imortalizar suas tacadas e tentar se transformar na próxima lenda do mercado financeiro. Que tal baixar a bola e manter seu dinheiro em aplicações cuja sistemática você compreende bem? Ah, sim, quem entende também perde dinheiro, mas sabe explicar os porquês da derrota e aprender com seus erros.
- Confio parcialmente em minha intuição. Desconfio de tudo aquilo que gera euforia demais em meu dia-a-dia. Leio tudo com atenção e respeito, mas com o objetivo de aprender, completar minha própria opinião sobre o assunto. Com isso, participam mais do processo decisório cotidiano a consciência e a disciplina, e menos a emoção e o efeito “Maria vai com as outras”. Funciona.
A crise dos erros
Como todo momento delicado, este episódio em que muitos perdem boas somas na bolsa ou amargam posições cada vez mais desvalorizadas nos lembra alguns erros básicos daqueles que decidem investir em ações despretenciosamente, sem se preocupar com os pormenores da questão e dos riscos nela envolvidos:
Erro 1: Viver de emoções
Quando os especialistas dizem que para investir em ações é preciso sangue-frio, não é exagero. Muitos aqui nunca investiram antes e, ao saber de uma crise, apavoram-se exageradamente. A maioria não viveu uma crise.
Emoção não combina com investimentos de risco, mas isso não é nenhuma novidade. Investidores experientes sabem a hora de emocionar-se com um grande negócio, mas geralmente o fazem só depois de tê-lo concretizado (por exemplo, depois de efetivamente vender um ativo cuja valorização foi expressiva).
Erro 2: Acreditar piamente no passado
A Bovespa trouxe excelentes retornos em 2007? Você havia comprado antes, vendeu na alta e viveu a euforia do mercado? Ótimo! Não viveu? Que pena, conviver com a realidade é preciso. O que interessa é a famosa frase, presente de forma obrigatória em todos os prospectos de investimento, que diz: “rentabilidades passadas não são garantia de rentabilidade futura”. Simples assim.
Erro 3: Investir pensando no curto prazo
Aqui repito aquilo que falo há muito tempo: investimento em ações só é recomendado para aqueles que vão usar os recursos da aplicação no futuro, no longo prazo. O universo que recomendo, e do qual faço parte, é do investimento em renda variável para 10 anos ou mais. Muito longe? Escolha alternativas mais seguras, menos emocionantes.
O dinheiro é seu!
Abalado pela crise, sim, mas com a cabeça erguida. Optei por não sair por ai ofendendo as diversas corretoras e bancos brasileiros pela queda nos preços das ações que possuo ou pelo problema financeiro que isso possa me trazer. “O dinheiro é seu” seria a resposta dada calmamente por meus gerentes. Sem falar que isso está muito bem coberto no contrato de risco entre investidor e operadores de mercado.
Assumir responsabilidades e riscos faz parte do universo adulto a que todos nós um dia nos submetemos. Se você pulou esta parte ou eventualmente prefere fingir que ele não existe, reclame com seus pais, responsáveis por sua educação, não comigo! O Dinheirama é um espaço de aprendizado, não um depósito irresponsável de dicas ou um oráculo.
Por fim, cabe ressaltar que não nos responsabilizamos por suas perdas no mercado de ações, pela quebra do Lehman ou pelo aumento da taxa de juros. Aqui, apenas procuramos compreender tais acontecimentos, aprender com eventuais erros e disseminar práticas inteligentes de planejamento financeiro que funcionam. O dinheiro, muito bem lembrado, é seu.
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