O Banco Central pediu ao indicado à presidência Gabriel Galípolo uma transição “mais suave possível”, tendo em vista a postura do diretor de política monetária na reunião de 8 de maio do Comitê de Política Monetária (Copom), quando ele foi apontado com o líder de uma divisão que abalou a credibilidade da autarquia.
“Após a sabatina e a aprovação pelos Senadores, a transição dos mandatos será feita da maneira mais suave possível, preservando a missão da instituição”, disse o BC em um comunicado publicado nesta tarde.
“Campos Neto tem trabalhado de forma harmônica e construtiva com o diretor Galípolo desde a sua chegada ao Banco Central. Campos Neto deseja a Galípolo muito sucesso nessa nova fase da sua vida profissional”, finalizou a nota.
Divisão no Copom
Após a decisão pelo corte e 0,25 ponto percentual na Selic em maio, para 10,5% ao ano, e a última do cilo de afrouxamento monetário, o mercado tomou conhecimento de um racha dentro do Copom.
Os diretores se dividiram em duas “alas políticas”, conforme fizeram a leitura os economistas naquela ocasião.
O lado “lulista” de diretores indicados pelo presidente, liderado por Galípolo, obteve 4 votos para uma redução de 0,5 p.p., enquanto a ala do mandatário atual, Roberto Campos Neto, ficou 5 votos para a decisão de 0,25 p.p..
“Galípolo possui um perfil mais político comparado aos recentes ocupantes do cargo, mas também é economista e tem experiência bancária, o que o mantém conectado ao mercado financeiro”, opina Evandro Buccini, Sócio e Diretor de gestão de crédito e multimercado da Rio Bravo Investimentos.
Ele lembra que a sua atuação como diretor do BC foi breve e marcada por dois períodos distintos.
“Inicialmente, um período mais dovish (preferindo cortar juros), no qual ele foi um voto vencido ao defender cortes maiores, e mais recentemente, um período mais hawkish (preferindo aumentar juros), onde ele foi possivelmente o membro mais hawkish do colegiado”, ressalta.
Buccini entende que, para ganhar credibilidade, Galípolo pode votar a favor de um aumento na taxa de juros na próxima reunião de 18 de setembro, alinhando-se com seu discurso. No entanto, resta saber se essa postura será mantida, já que ele não segue os mesmos modelos que a maioria no Banco Central.
Jogo de cena
Esta atuação “dúbia” de Galípolo transparece na opinião dos economistas. Enquanto alguns veem uma postura alinhada aos desejos de Lula, outros ainda acreditam que as declarações recentes de compromisso com o controle da inflação resultarão em uma atuação independente.
“Quando Gabriel Galípolo assumir a presidência do Banco Central, a instituição deverá continuar a focar com responsabilidade nas suas metas primárias, especialmente no controle da inflação”, acredita a economista-chede da CM Capital, Carla Agenta.
Cortejando Lula
Finalmente anunciado como indicado para a presidência do Banco Central, Gabriel Galípolo se aproximou de Luiz Inácio Lula da Silva quando o petista ainda era candidato a presidente da República, em 2022. Ele foi um dos responsáveis por fazer a ponte entre o petista e o mercado financeiro.
Lula foi reabilitado para eleições em 2021, quando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin anulou ações contra o petista. Em seguida, o Supremo invalidou todas as condenações contra Lula na Lava Jato, que o haviam levado para a cadeia.
Assim que retomou a elegibilidade, Lula passou a trabalhar em sua candidatura presidencial. Uma das principais tarefas era recriar laços com o PIB. O empresariado e o mercado financeiro têm desconfianças com o PT desde sempre. A situação ficou pior depois da crise econômica do governo de Dilma Rousseff.
A atuação de Galípolo foi parte de um movimento mais amplo, que envolveu acenos ao setor produtivo. Lula teve uma série de jantares e outros encontros com banqueiros, industriais e empresários de diversas outras áreas.
Outros nomes importantes nesse processo foram Walfrido Mares Guia (Kroton) e José Seripieri Filho (Qsaúde), conhecido como Júnior da Qualicorp, ambos amigos de longa data do hoje presidente da República. Também participaram do esforço os advogados Walfrido Warde e Marco Aurélio de Carvalho.
Aprovação de Galípolo para o Senado
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, evitou estimar uma data para quando ocorrerá a sabatina do indicado à presidência do Banco Central, Gabriel Galípolo, que atualmente é diretor de Política Monetária da instituição. Ele afirmou, contudo, que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, já chegou a discutir o assunto com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.
Para Haddad, a importância dessa indicação está sintonizada entre Pacheco e o presidente da República.
Em anúncio à imprensa, o ministro também comentou que tentou falar com Pacheco há pouco, sem sucesso, e que voltará a ligar para o presidente do Senado para tratar do assunto relativo à escolha de Galípolo.
“O presidente Lula chegou a discutir com Pacheco qual seria a melhor oportunidade, cabe ao Senado marcar e decidir, mas creio está sintonizado entre Lula e Pacheco em relação à importância dessa indicação. Então vamos aguardar pronunciamento de Pacheco. Tentei agora há pouco falar com ele, não consegui, saindo aqui vou voltar a ligar para conversar sobre. Mas Lula já tinha conversa com Pacheco e vamos respeitar a institucionalidade da Casa, que tem seus ritos e afazeres e vai julgar o momento para realizar a sabatina”, disse Haddad.
(Com Estadão Conteúdo)