Roberta comenta: “Navarro, em 2010 consegui um emprego melhor e minha renda cresceu. Aproveitei para comprar algumas coisas que desejava há algum tempo, mas acabei me deixando levar pelos apelos de consumo. Exagerei e hoje estou enrolada, com muitas dívidas e sem conseguir aproveitar a mudança profissional. Empréstimo, financiamento, tenho de tudo. Socorro!”.
Para muitos, a compra parcelada representa a “grande sacada”: é possível comprar o produto tão esperado (normalmente caro e fora do orçamento), levá-lo imediatamente para casa e só pagá-lo “de leve”, em “suaves” prestações. Televisão nova, videogame, geladeira, sofá, armário, moto, carro, praticamente tudo o que está a venda pode ser comprado assim.
Há quem diga que “a única forma de nossa família ter as coisas é comprando parcelado”. Antes de qualquer observação, escuto logo a justificativa “não fosse assim, não teríamos compromisso com o pagamento e a construção de patrimônio”. O raciocínio está em todo lugar, você deve conhecer algumas (muitas) pessoas assim.
Que é legal poder comprar tudo que a gente quer, não tenho dúvida. Mas o que fazer quando o verbo comprar está completamente desvirtuado? Quero dizer, como agir quando dinheiro não é realmente o que se tem que ter para sair da loja com esse ou aquele produto?
A realidade cobra seu preço!
Os meses de dezembro de 2011 e janeiro de 2012 foram marcados pela elevação das reservas destinadas a cobrir prejuízos com inadimplência. As chamadas provisões para créditos duvidosos cresceram em ritmo maior que o da oferta de crédito, indicando que os principais bancos temem o recente avanço da inadimplência.
De acordo com levantamento realizado pela consultoria Austin Rating, as provisões de 23 bancos de grande e médio porte cresceram 42,2% em 2011, número mais de duas vezes maior que o da expansão das carteiras destas mesmas instituições no período (19,8%).
Dados oficiais publicados pelo Banco Central deixam claros os motivos de preocupação: o percentual de atrasos acima de 90 dias nas prestações de empréstimos a pessoas físicas chegou a 7,6% do total em janeiro deste ano, representando um avanço de 33% em relação a janeiro de 2011, quando o percentual era de 5,7%.
A última vez em que os índices de inadimplência chegaram a patamares semelhantes foi em dezembro de 2009, em decorrência dos reflexos da crise – sendo o desemprego o principal fator na época.
Observado o atual estágio econômico do país, onde o desemprego atinge níveis historicamente baixos e a renda é crescente, o problema parece ser a relação do brasileiro com a abundante oferta de crédito e as facilidades na obtenção de empréstimos e financiamentos.
O economista Roberto LuisTroster resumiu bem o quadro em recente entrevista ao jornal Folha de S. Paulo: “Os dados de inadimplência confirmam que a dinâmica recente do crédito não é sustentável indefinidamente”.
A saída passa por assumir a culpa e lidar com suas consequências
Livrar-se do endividamento sempre é possível, mas requer boas doses de humildade e coragem. Humildade para reconhecer que os principais culpados pelo problema são você e as decisões que você tomou enquanto consumia sem planejamento. Coragem para enfrentar a carga de responsabilidades e consequências que a humildade colocará diante de seus olhos.
Tente ser pragmático e ao mesmo tempo objetivo, focando seus esforços em ações com resultados práticos, palpáveis. Só assim a motivação para seguir adiante será maior que a tentação de voltar ao mundo mágico (e falso) da “terapia pelo consumo”. Experimente:
- Assumir a responsabilidade. Eu concordo que gastar é muito mais legal que poupar, mas é hora de encarar as coisas de uma forma mais adulta;
- Listar todos os seus compromissos financeiros, saldos devedores, taxas de juros, prazos de vencimento e informações de contato de cada dívida. Esse registro será sua missão de agora em diante;
- Registrar seus gastos e receitas de maneira que seu orçamento doméstico seja criado. Só assim você saberá exatamente onde estão os problemas (onde você gasta demais) e quais aqueles gastos que não poderão ser trabalhados;
- Renegociar suas dívidas de forma inteligente, preferindo quitar as dívidas mais caras e de menos parcelas primeiro. Pagar o mais caro acabará logo com o que mais prejudica seu fluxo de caixa, enquanto pagar as dívidas que estão quase no fim darão a necessária sensação de missão cumprida.
Quando tudo parecer chato e entediante, lembre-se das decisões que tomou e do ciclo perigoso que enfrentava há pouco tempo atrás. Volte ao primeiro item da lista acima e recomece. Enfrente as frustrações de cabeça erguida, afinal o problema é seu.
O que vem por ai?
Tudo indica que o Brasil voltará ao caminho de crescimento ainda em 2012, especialmente se a tendência de queda dos juros (Selic) se confirmar. Isso deve contribuir para a queda da inadimplência, mas o ritmo de expansão do crédito deverá elevar-se de forma mais comedida.
Ainda que o número de inadimplentes não assuste tanto, fica latente a necessidade de investimento e dedicação em busca de educação financeira. Afinal, independentemente da abusiva oferta de dinheiro fácil, somos nós os responsáveis por assinar os contratos e fazer mau uso do crédito oferecido.
Se você já enfrentou problemas de endividamento excessivo, que tal compartilhar conosco suas experiências e decisões que contribuíram para lidar com a situação? Use o espaço de comentários abaixo. Até mais.
Foto de sxc.hu.