Ao longo dos meses de maio a julho de 2024 o mercado de fundos imobiliários recebeu com preocupação as notícias de inadimplência da locatária WeWork em diversos prédios de propriedade de alguns FIIs.
Inicialmente, lembre-se do modelo de negócio da WeWork, isso faz total diferença para mensurar a reação dos proprietários em caso de inadimplência.
Trata-se de uma empresa de Coworking, ou seja, a empresa aluga espaços corporativos, assume o custo de fit out (mobiliário e infraestrutura) e subloca estes espaços para empresas e/ou profissionais que não querem ter o custo/trabalho referente ao preparo do espaço corporativo para receber a operação da empresa e com alguns itens do dia a dia que tão são arcados pela operadora do coworking.
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O modelo gera vantagem para os 3 atores: O proprietário do imóvel loca uma área maior, para uma só contraparte (apenas um contrato para administrar) sem maior trabalho na operação diária do prédio. A operadora do coworking (locatária) utiliza sua capacidade de ganho de escala para barganhar melhor condições de locação do espaço junto aos proprietários, assim como reduzir os custos para preparação e operação do espaço corporativo e com isso, potencializa a margem de lucro com a receita aferida junto aos sublocatários. O usuário final (sublocatário) recebe um espaço corporativo pronto para uso, por vezes sob medida, e pode focar sua atenção em seu negócio principal.
Ocorre que a WeWork, uma gigante no mundo do coworking surpreendeu o mercado ao longo dos meses de maio, junho e julho com um inadimplemento em série dos alugueis em diversos prédios por ela locados, alguns deles tendo FIIs como proprietários.
Tendo como base informacional, fatos relevantes e comunicados ao mercado disponibilizados por fundos imobiliários listados na B3, vamos à cronologia dos fatos:
• 13/6/24: TRNT11, gestão VBI, emitiu fato relevante informando inadimplência da WeWork, competência maio, fato que se repetiu nos meses seguintes (competências junho e julho).
• 26/6/24: SARE11, gestão Santander, informou ao mercado a inadimplência de WeWork referente ao mês de maio, fato que se repetiu no mês seguinte.
• 28/6/24: VINO11, gestão Vinci Partners, comunicou ao mercado que a WeWork, locatária do imóvel “OF 585”, não realizara o pagamento do aluguel de junho. A inadimplência era de 5% das receitas totais do fundo e a área inadimplida representava 4% da ABL (área bruta locável) do FII.
• 1/7/24: RCRB11, gestão Rio Bravo, comunicou ao mercado que a WeWork, locatária do imóvel “Girassol 555”, atrasou o pagamento do aluguel com vencimento em junho.
• 1/8/24: BRCR11, gestão BTG, informou através do relatório gerencial que a locatária WeWork estava inadimplente dos alugueis de maio e junho. Puxão de orelha para o gestor. Nenhum fato relevante para informar inadimplência desde a competência maio, deixando para informar em uma nota de 4 linhas, sem maiores detalhes, no relatório gerencial base julho, publicado em agosto? Transparência informacional com a devida tempestividade é critério de seleção de FIIs para este analista …
Não preciso nem dizer o que aconteceu com as cotas de tais FIIs. Caíram fortemente em resposta a inadimplência.
“Ah Ricardo, não foi só a inadimplência, o mercado está ruim para FIIs.”
Disso eu não tenho a menor dúvida, mas observe o quadro abaixo:
No lado esquerdo, temos o retorno dos 5 fundos expostos a WeWork, conforme elencamos os eventos de inadimplência ao longo deste texto. No lado direito, outros 5 fundos imobiliários do mesmo setor, todos multiativos, sem exposição a WeWork.
Aferimos o retorno total de cada FII, bem como a média de cada grupo, desde 15/06/24, data de divulgação do primeiro Fato Relevante (TRNT11) informando inadimplência da WeWork (vide listagem acima), até o fechamento de 16/10/24.
É notório como o grupo que possui a WeWork em sua lista de locatários, independente da participação desta sobre a receita total, sofreu mais do que o grupo que não tem exposição à WeWork. A média da queda sofrida pelo grupo com a WeWork como locatária é mais do que 4x superior a queda sofrida pelo grupo sem a WeWork, sendo queda de 14,5% para o grupo exposto à WeWork e -3,5% para o grupo sem exposição à cia.
Há exagero no movimento. Mesmo que busquemos outras razões para tentar justificar a diferença na performance dos grupos nesta janela em que se multiplicavam as notícias negativas sobre WeWork, como localização dos imóveis, existência de rendimento não recorrente ajudando na distribuição de algum FII, etc, fato é que, na opinião deste analista, há fortes indícios de que tivemos reação exagerada do mercado em relação ao grupo que possui a WeWork como locatária.
Agora vamos aos fatos mais recentes do WeWork:
Entendo que a própria natureza da operação da WeWork acabou sendo um alento para os proprietários neste cenário. Explico: a inadimplência era da WeWork, não das reais ocupantes dos espaços corporativos, ou seja, das empresas clientes da WeWork. De uma maneira muito simplista para compreensão do grande público, no limite, haveria a possibilidade de se retirar a WeWork de cena, em seu lugar colocar algum outro operador de coworking interessado em assumir a operação e vida que segue. Os proprietários poderiam endurecer na negociação.
Por trás de toda simplicidade embutida neste raciocínio há questões jurídicas que deveriam ser tratadas com algum grau de complexidade, mas sou analista de real estate e não advogado e do ponto de vista imobiliário não jurídico, as edificações não tinham perdido atratividade para as reais ocupantes, a troca da operadora manteria tais ocupantes, adimplentes em suas obrigações, fazendo uso dos espaços e o fluxo de caixa para os proprietários seria reestabelecido.
Não obstante, Rio Bravo (RCRB11) e Vinci Partners (VINO11) impetraram ação de despejo da locatária.
Ao longo de setembro/24, ambas obtiveram liminar determinando que a locatária efetuasse no prazo de 15 dias o pagamento de todos os valores devidos e em caso de não cumprimento da determinação, deveria deixar as edificações dentro de tal prazo.
Fato é que o que se viu foi um conjunto de comunicados ao mercado e fatos relevantes mostrando que as situações de inadimplência estavam sendo endereçadas.
• SARE11 informou em 20/9/24 que formalizou acordo para recebimento de 50% dos valores inadimplidos da WeWork à vista e o restante parcelado nos meses subsequentes. A locatária segue ocupando a mesma área e deverá respeitar o fluxo do contrato normalmente.
• TRNT11, em 26/9/24, informou acordo feito com a WeWork. Empresa manterá ocupação integral e os valores inadimplidos foram renegociados para pagamento em 8 parcelas, além disso, o restante do contrato sofreu revisão negativa de valor promovendo redução da receita imobiliária do fundo.
• VINO11 comunicou em 11/10/24 que recebeu todos os valores devidos acrescidos de multas e encargos e em comum acordo com a WeWork, antecipou o encerramento do contrato para 31/10/24, data em que a empresa deve entregar a posse da edificação.
• RCRB11 comunicou em 03/10/24 o acordo comercial com pagamento imediato dos valores atrasados livres de multas e encargos, além de desocupação parcial da área ocupada com pagamento de multa de rescisão a ser paga até o fim do semestre, além de desconto pontual por 12 meses no restante da área que continua sendo ocupada pela WeWork.
• BRCR11 informou no relatório gerencial de setembro que todas as pendências da WeWork foram regularizadas com quitação integral e sem nenhum tipo de concessão à locatária
Veja como em todos os casos, valores passados foram recuperados, com maior ou menor velocidade, mas foram. E em apenas um caso, VINO11, a WeWork deixou totalmente a edificação.
Inadimplência e embates com locatários vão surgir ao longo da vida do investidor imobiliário, isto faz parte do jogo. Nestes momentos alguns fundamentos são postos à prova: qualidade do imóvel, importância do ativo para o ocupante, força da localização para eventual nova ocupação e claro, a segurança do contrato de locação para preservar os direitos do proprietário.
Reagir de forma emocional ao evento de inadimplência seguramente foi uma péssima decisão dos investidores que venderam suas contas com tamanha desvalorização ao longo do período em que os fatos se desenrolavam.
Por favor, entenda a dinâmica imobiliária antes de comprar cotas de FIIs. Além da oscilação dos preços das cotas no mercado secundário afinal, isto é renda variável, a própria renda gerada pelos fundos imobiliários que gera os bem-vindos rendimentos mensais tão possuí elementos variáveis e a inadimplência é um deles. Este mundo com tantos elementos variáveis não é feito para os impacientes, estes neste mundo, estão fadados a perder dinheiro, por favor, não engrosse esta estatística.