O governo quer começar a integrar baterias e outras soluções de armazenamento de energia ao sistema elétrico brasileiro e deve propor que essas tecnologias disputem dois leilões previstos para o início de 2024, um para contratar potência e outro para descarbonizar a matriz elétrica da Amazônia, disse à Reuters um secretário do Ministério de Minas e Energia.
Os certames representariam uma importante oportunidade de desenvolver um mercado hoje incipiente no Brasil, onde as baterias têm uso restrito e associado principalmente a um “backup” na ponta do consumidor de energia.
No caso da Amazônia, a proposta de agregar baterias e geração renovável tem benefícios não só de ordem ambiental, ao substituir o uso de geradores a diesel, caros e poluentes, mas também econômicos, reduzindo custos bilionários hoje compartilhados por todos os consumidores do país.
As baterias, que poderiam armazenar energia de fontes intermitentes como a eólica e solar em forte crescimento no Brasil, devem entrar no sistema em momento em que a operação da rede elétrica no país se torna mais complexa e passa a exigir mais flexibilidade dos agentes.
“A gente está passando por uma transformação acelerada da matriz energética, do sistema de transmissão, estamos com essa fronteira da descarbonização dos sistemas isolados, então a gente está vendo várias oportunidades para o armazenamento”, disse Thiago Barral, secretário de Transição Energética e Sustentabilidade do ministério, em conversa com a Reuters.
As primeiras grandes oportunidades para esse mercado devem vir em 2024, com diferentes leilões do governo previstos para o primeiro semestre, com destaque para o de potência.
O leilão de potência funciona como uma espécie de contratação de segurança no fornecimento de energia elétrica, no qual empreendimentos de geração podem oferecer sua capacidade para atender momentos de pico do sistema. No primeiro certame, realizado em 2021, apenas termelétricas puderam participar.
“O sistema está mudando e a demanda de potência que é aquele atendimento nas horas mais críticas, naquelas poucas horas em que dá um pico de demanda e uma baixa de geração aí o armazenamento pode vir a cumprir um papel cada vez mais relevante”.
O ministério ainda está avaliando como o produto “armazenamento” irá ser incluído no leilão. Uma das ideias é que as baterias sejam combinadas com usinas renováveis, que as abasteceriam com energia. Outra opção seria contratar uma bateria “sozinha”, com a forma de carregamento ficando a cargo do operador do equipamento.
Barral lembrou ainda que mais soluções de armazenamento estão em estudo, como expansão de capacidade de hidrelétricas existentes e até hidrelétricas reversíveis.
“As termelétricas são efetivamente, digamos assim, a solução mais evidente para atendimento da demanda de potência, mas a gente está calibrando justamente como é que a gente pode criar um espaço para também experimentar a competitividade e ajudar a revelar o preço dessas soluções.”
Ainda não há data para lançamento da consulta pública sobre o certame, mas ela deverá ser aberta ainda neste ano.
Barral não comentou quanta potência poderá ser contratada no certame, uma vez que essa é uma informação estratégica e que permanece sigilosa até o leilão. Em 2021, foram contratados 4,6 GW, apenas de termelétricas.
Comunidades da Amazônia
As baterias associadas a fontes de geração renováveis também se mostram uma combinação atrativa para descarbonizar comunidades isoladas da Amazônia que não recebem eletricidade do Sistema Interligado Nacional (SIN) e que dependem de geração local a diesel, cara e poluente.
Já existem alguns projetos do tipo em andamento que agregam baterias e usinas solares, como a Vila Restauração, da Energisa, que atende 200 famílias no Acre, mas o novo plano de descarbonização do governo pode acelerar a adoção dessas soluções.
“Nos sistemas isolados, até pelo alto custo (da geração a diesel), a gente já vê uma atratividade bastante relevante para esse tipo de aplicação (fontes renováveis associadas a baterias).”
O Brasil tem cerca de 250 localidades isoladas, a maior parte na região Norte, e estima-se que 80% ainda seja atendida por geração a diesel. O combustível fóssil é subsidiado pela Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), custeada por todos os consumidores na conta de luz, e que neste ano atingiu orçamento de 12 bilhões de reais.
Barral afirmou que os detalhes do próximo leilão de sistemas isolados ainda estão sendo finalizados, e lembrou que o governo pode adotar ainda outras alternativas para atender as comunidades a depender de sua localização, como conectá-las à rede nacional de transmissão ou fazer subrogação da CCC para que o atuais geradores a diesel utilizem esses recursos em investimentos em baterias.
Uma terceira oportunidade para as baterias, não associada aos leilões já previstos, está na aplicação para redes de transmissão e distribuição, atendendo requisitos de potência por algumas horas.
Em alguns casos, essa é uma alternativa economicamente atrativa para “economizar” expansão dessas redes, apontou Barral, lembrando que o Brasil já tem um projeto implantado pela ISA Cteep que usa baterias para equilibrar momentos de pico de carga no litoral paulista.