Ao longo dos anos trabalhando com educação financeira, percebi que boa parte das pessoas acreditam cegamente que a principal razão para seus problemas financeiros é a falta de dinheiro.
É muito comum ouvir lamentações do tipo “Não recebo o salário que mereço”, “Ganho tão pouco”, “Nunca tive a sorte de ganhar uma bolada sorteio nenhum” ou ainda “Minha herança foi uma merreca”. Tenho certeza de que você também já ouviu coisas assim.
A grande maioria, quando começo um trabalho de planejamento para adequar o padrão de vida, continua se lamentando e focando suas energias no ponto errado: acreditar que a falta de dinheiro é a razão dos problemas (fica a sensação de ganhar pouco e, dessa forma, ter pouco dinheiro para gastar).
Dinheiro é um Santo Remédio
Já ouvi essa lamentação sobre falta de dinheiro de muitas pessoas, inclusive daquelas com faixa de renda que considero alta. É muito comum encontrar pessoas que recebem mais de R$ 20 mil mensais reclamando de ter pouco dinheiro. A constatação é que quanto mais ganham, mais a sede de demonstrar poder (através do dinheiro) os transforma para pior.
No livro best-seller “Dinheiro é um Santo Remédio”, os autores André Massaro e Conrado Navarro utilizaram uma pesquisa interessante, realizada pela Associação Americana de Psicólogos (American Psychological Association – APA), que mostra que para 75% dos indivíduos entrevistados o dinheiro é o principal fator causador de estresse.
Já que dificilmente você e eu encontraremos alguém que reclame por ter muito dinheiro, parece natural entender que o que causa o estresse é a falta de dinheiro (para essas pessoas da pesquisa, pelo menos).
Dívidas: muito cuidado com as parcelas
Se a falta de dinheiro se tornou um grave problema que afeta a vida das pessoas, é natural e muito provável que muitos indivíduos deste grupo estejam atravessando um período de endividamento.
O atual cenário econômico do Brasil é cruel com quem recorre a linhas de crédito mais comuns, como cheque especial e a modalidade rotativa do cartão de crédito (aliás, recentemente o governo elevou os juros – Selic – e o IOF – Imposto sobre Operações financeiras – das operações de crédito de 1,5% para 3% ao ano).
Para entender o impacto do aumento, veja o seguinte exemplo: utilização de R$ 5 mil do cheque especial por 20 dias. A taxa média de juros do cheque especial é, atualmente, de 8,92% a.m. Antes do aumento, o correntista do banco pagaria R$ 350,58; com o aumento, o valor sobe para R$ 355,10.
Em um primeiro momento, boa parte das pessoas pensará apenas no valor da parcela. Talvez essa elevação não pese tanto no bolso, mas ao colocarmos na ponta do lápis todas as contas somadas do mês e projetá-las para o ano, certamente o cenário será outro (e também a sua percepção).
No recente artigo “Compras Parceladas Criam um Padrão de Vida Artificial”, Conrado Navarro faz uma interessante constatação:
“Compras parceladas são uma comodidade tipicamente brasileira. Este hábito não existe em países desenvolvidos, onde a compra ocorre em uma parcela via cartão de crédito ou débito total à vista no dinheiro ou cartão de débito. O que existe lá fora são financiamentos, mas não para comprar produtos simples (o que acontece aqui). Evite a tentação de comprar muito ‘porque as parcelas serão relativamente pequenas’ e prefira economizar e negociar o melhor preço à vista possível quando tiver o montante para tal.”
Onde e como você gasta seu dinheiro?
Por trás das desculpas e pensamentos que jogam a culpa na falta de dinheiro esconde-se uma questão fundamental: afinal de contas, como utilizamos o nosso dinheiro? Podemos nos considerar consumidores conscientes, que prezam por boas negociações e que procuram gastar de acordo com as (reais) possibilidades?
A resposta para essas dúvidas colocadas acima é negativa para boa parte das pessoas, pois são poucos os que respeitam os princípios básicos da educação financeira. A vontade de ter algo de imediato é mais forte do que o medo de enfrentar uma situação de descontrole financeiro. Será que o agora vale mais do que o futuro?
“O dinheiro suscita a maior parte das vociferações que ouvimos: é o dinheiro que fatiga os tribunais, é ele que coloca pais e filhos em desavença, é ele que derrama venenos, é ele que põe a espada nas mãos dos assassinos e das legiões; ele está manchado de sangue nosso; é por causa dele que as discussões de marido e mulher ressoam na noite, é por causa dele que a turba aflui aos tribunais; por causa dele, os reis massacram, saqueiam e arrasam cidades que demoraram séculos a construir, para procurarem ouro e prata entre as cinzas” (Séneca)
Portanto, atenção para o básico: como você gasta o seu dinheiro é mais importante do que quanto você ganha. Para conseguir lidar com esse fato, é preciso ter um orçamento familiar minimamente organizado. Não conte apenas com mais dinheiro para lidar com seus problemas, mas também com mais organização, disciplina e dedicação.
Conclusão
Estamos atravessando um momento crucial em nosso país, uma vez que o ajuste financeiro e a possível falta de crescimento, somados à inflação em alta, possivelmente deixarão no meio do caminho muitas vítimas. Muita gente fala em elevação do desemprego, o que comprometerá muito mais a vida das pessoas.
Nesse cenário, é fundamental aceitarmos que apenas mais dinheiro não vai resolver nossas questões familiares e pessoais. A solução passa por entendermos como anda nossa relação com o dinheiro, prestando atenção não só ao quanto ganhamos, mas também e principalmente em como o estamos gastando (estou sendo repetitivo, mas de propósito!).
É hora de priorizar o que de fato é indispensável nesse momento! Se você está endividado, procure quitar tudo o que puder o mais rapidamente possível. Evite financiamentos longos e jamais sem esqueça de sempre buscar uma boa negociação ao realizar suas compras.
Atravessar períodos de crise é sempre um desafio enorme, mas no meio da travessia surgem boas oportunidade de prosperar e dar um salto de qualidade nos relacionamentos, na vida e no trabalho. Olho vivo, foco e planejamento! Até a próxima.
Foto “Losing money”, Shutterstock.