O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acertou ao reduzir as críticas contra o Banco Central, repassando à autoridade monetária a responsabilidade sobre oscilações de mercado antes atribuídas às falas do mandatário, disse o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, defendendo enfaticamente que Gabriel Galípolo seja o próximo presidente da autarquia.
Conselheiro pessoal de Lula e mais longevo ministro da Fazenda da história do país, Mantega disse em entrevista à Reuters que opina “periodicamente” quando acionado pelo presidente, e sugeriu que a equipe econômica aproveite o debate sobre a independência financeira do BC para “aprimorar” a autonomia do órgão, embora não veja espaço para mudanças mais fortes na regra.
Mantega foi um dos economistas ouvidos por Lula em reunião em São Paulo no fim de junho que marcou uma mudança de comportamento do presidente, interrompendo uma onda de ataques não apenas ao patamar dos juros, mas à autonomia do BC e ao presidente da autarquia, Roberto Campos Neto.
“Estava havendo um excesso de ruído em função das críticas, então eu achava que tinha que parar esse tipo de coisa e se reestabelecer a tranquilidade… O mercado estava usando isso contra o governo, dizendo que o presidente era responsável pela desvalorização maior (do real), o pessoal estava se aproveitando”, disse Mantega na tarde de segunda-feira.
Para o ex-ministro, o BC errou na dose da política monetária, pecou ao não atuar ativamente para atenuar volatilidades no câmbio e forçou uma piora das expectativas de mercado quando abandonou as indicações futuras de cortes de juros.
Ele avaliou que Campos Neto atua politicamente ao demonstrar proximidade com o governador de direita de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), mas ponderou que Lula fez bem ao amenizar o tom.
“A decisão (de interromper as críticas) foi acertada, porque aí a responsabilidade fica claramente com o BC, não fica mais com quem criticou. É o BC que está com a faca e o queijo na mão, a responsabilidade é dele e do que ele está fazendo”, afirmou.
Defesa de Galípolo
Com o mandato de Campos Neto se encerrando em dezembro, o ex-ministro defendeu que o próximo presidente do BC seja técnico, experiente e entenda profundamente de macroeconomia, acrescentando ser importante que o candidato tenha proximidade e a confiança de Lula.
“O Gabriel Galípolo tem esse perfil, é um sujeito equilibrado, que já escreveu livros, é experiente, passou cinco ou seis anos numa instituição financeira e tem esse equilíbrio, não vai obedecer à ala política do partido ou algo do tipo. Ele reúne essas qualidades”, afirmou Mantega, ponderando que essa é uma avaliação pessoal, mas que seria uma “excelente escolha” se confirmada.
“O presidente tem confiança no Galípolo, e isso é importante”, acrescentou.
Lula fez elogios públicos a Galípolo, que atualmente ocupa a diretoria da Política Monetária do BC, mesmo após ele se unir ao restante dos diretores da autarquia e votar em junho pela interrupção nos cortes da taxa básica de juros, atualmente em 10,50% ao ano.
Na semana passada, ele também se alinhou a uma visão mais dura, com a diretoria afirmando de maneira unânime que não hesitará em elevar a Selic se necessário.
Enquanto o Ministério da Fazenda avalia projeto para concentrar a supervisão do mercado financeiro no BC e na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), tema que corre em paralelo ao debate no Congresso sobre a independência financeira do BC, Mantega sugeriu que a oportunidade seja usada para discutir ajustes na autonomia operacional do órgão.
“Pode ser que com essa proposta feita pelo Ministério da Fazenda, que é uma proposta boa, você possa aprimorar outras questões relativas ao Banco Central, à autonomia do Banco Central”, disse.
Ele defendeu, por exemplo, que as decisões de política monetária levem em consideração, com peso maior, os efeitos sobre a atividade e o emprego.
Na regra atual, o BC também tem entre os objetivos suavizar as flutuações da economia e fomentar o pleno emprego “sem prejuízo de seu objetivo fundamental” de assegurar a estabilidade de preços.
Mantega também disse discordar da regra que faz o mandato de quatro anos do presidente do BC indicado por um governo durar até a metade da gestão do presidente seguinte.
Ele, no entanto, afirmou não ver margem no Congresso nem interesse do governo por uma mudança nessa regra.
O ex-ministro elogiou a gestão do ministro Fernando Haddad na Fazenda, argumentando que ele propôs o ajuste de distorções tributárias enquanto busca a correção de fraudes em cadastros de programas sociais.
“O governo do presidente Lula está justamente no caminho de equilibrar as contas públicas, sem prejudicar o crescimento da economia, sem prejudicar o aumento do investimento. Você não pode dizer que o fiscal está fora de controle”, afirmou.
Ele ainda defendeu que a desoneração da folha salarial de setores da economia, criada durante sua gestão no governo Dilma Rousseff, já cumpriu seu papel e não tem mais efeito positivo que justifique sua manutenção.
O benefício, criticado pela equipe de Haddad, está desde o ano passado no centro de uma disputa entre governo e Congresso, que prorrogou o incentivo sem apresentar medidas para compensar seu custo.