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Masp inaugura exposições para marcar o ano das histórias indígenas

Mostras discutem a diversidade e a complexidade da cultura indígenas

por Agência Brasil
3 min leitura
Masp

O Museu de Arte de São Paulo (Masp) inaugura nesta sexta-feira (30) três exposições para marcar o ano das Histórias Indígenas, tema que o museu escolheu para apresentar e discutir a diversidade e a complexidade dessas culturas.

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A primeira dessas mostras reúne 721 objetos arqueológicos de arte produzidos por povos ameríndios entre os séculos 2 a.C. e 16. Chamada de Comodato Masp Landmann – cerâmicas e metais pré-colombianos, a exposição ocupa o segundo subsolo do museu e tem curadoria de Marcia Arcuri e assistência de Leandro Muniz.

É a segunda exposição dedicada ao comodato da coleção de Edith e Oscar Landmann, emprestada ao museu em 2016 por um período de dez anos. A primeira mostra dessa coleção apresentou um conjunto de tecidos que integrou a programação do museu em 2019, dedicada às Histórias das mulheres, histórias feministas.

À Agência Brasil, a curadora informou que nesta segunda mostra do comodato estarão em exibição objetos atribuídos a 35 culturas arqueológicas do continente americano, entre elas, peças nasca, inca, mochica, inchu, paracas e até marajoara, da Amazônia brasileira. Esses artefatos constituem um legado histórico e científico e foram construídos pelas antigas populações de regiões que hoje pertencem aos territórios do Equador, Peru, Colômbia, Venezuela, Panamá, México, Brasil e dos países caribenhos.

“Nesse tipo de trabalho sobre coleções, partimos dos conjuntos de objetos para o que sabemos sobre a história do continente no período que precedeu a invasão europeia. Mas não podemos atribuir as peças a uma determinada etnia ou um povo. Então trabalhamos com conceito de culturas arqueológicas. Nesse caso, a exposição reúne peças de 35 culturas arqueológicas, que é o nome que a gente dá para esses conjuntos estilísticos”, explicou Marcia Arcuri, curadora-adjunta de Arte Pré-colombiana do Masp. “A coleção realmente reúne um repertório bastante significativo do que a gente conhece desse passado pré-colombiano entre mais ou menos 1600 antes de Cristo até o século 16”.

De acordo com a curadora, a maior parte das peças são em cerâmica e provém de contextos funerários ou rituais de oferendas. “Mas há também artefatos feitos em metais como ouro e cobre dourado. E tem alguns objetos em ossos, conchas e, claro, peças que integram mais de um material”.

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A mostra, segundo Marcia Arcuri, acontece em um momento em que o museu se dedica às histórias indígenas e o país discute o marco temporal, projeto que tramita no Congresso e impacta diretamente nos processos de demarcação de territórios indígenas. “É um movimento bastante amadurecido do museu, que vem apresentando uma série de mostras relacionadas a essa diversidade de protagonistas, de componentes e de noções a partir das quais temos que entender esse tecido social que é a cultura. Essa discussão vem em boa hora”, explicou. “Uma instituição como o Masp, trazer para o público brasileiro, que conhece muito pouco desse universo, a oportunidade de conhecer um pouco desse passado e o quanto ele fala de temas que estão tão presentes, é algo ímpar”, destacou.

A exposição Comodato Masp Landmann – cerâmicas e metais pré-colombianos fica em cartaz até o dia 3 de setembro.

Sheroanawe Hakihiiwe

A segunda exposição aberta nesta sexta-feira apresenta obras do artista yanomami venezuelano Sheroanawe Hakihiiwe, entre desenhos, monotipos e pinturas produzidos sobre papéis artesanais, fabricados por ele por meio do uso de fibras nativas.

A mostra, intitulada Sheroanawe Hakihiiwe: tudo isso somos nós, será apresentada ao público até o dia 24 de setembro no primeiro subsolo do museu e tem curadoria de André Mesquita e do assistente curatorial David Ribeiro. O subtítulo da exposição Ihi hei komi thepe kamie yamaki [Tudo isso somos nós] foi uma sugestão do próprio artista para incorporar a diversidade de elementos que formam sua comunidade e seu entorno.

No total, a exposição apresenta um conjunto de 48 obras, muitas delas de grandes dimensões. Uma dessas obras, por exemplo, chamada de Oni Komi Thepe ou Grupo de Desenhos, é composta por 62 monotipias, que foram dispostas lado a lado e ocupam a parede final da exposição. “Isso está muito relacionado ao título que o próprio artista escolheu para dar nome à exposição, Tudo isso somos nós, que é uma noção de conjunto e de uma produção que está toda articulada e que expressa tudo aquilo que faz parte da identidade yanomami, principalmente relacionada com o ambiente e o espaço em que esse povo vive”, explicou David Ribeiro, à Agência Brasil.

“Hakihiiwe se expressa artisticamente desde a década de 90, depois que ele fez uma oficina de produção de papel artesanal com uma artista mexicana chamada Laura Anderson Barbata. Nessa oficina, ele e outras pessoas da comunidade aprenderam a fazer papéis de diversas fibras como cana, milho e algodão e fibras nativas como amoreira e, com isso, eles começaram a produzir materiais para divulgar coisas sobre a cultura yanomami”, informou o curador.

Ribeiro destacou que essa produção artesanal do artista entende o papel “como algo vivo”, o que acaba dialogando com a forma como seu povo entende a arte. “Não só para os yanomami, mas para a população indígena em geral, a arte sempre esteve relacionada ao corpo, nunca como algo externo”, explicou. “A ocupação dessa superfície do papel artesanal vivo tem relação com essa arte, que originalmente é transposta sobre a pele”, acrescentou.

Essa é uma das razões pela qual o artista opta por ocupar todos os espaços da folha, disse o curador, “assim como se faz com a pintura corporal que ocupa toda a superfície da pele”.

Para compor seus trabalhos, Hakihiiwe fica cerca de seis meses na floresta, observando a fauna, a flora e comunidades indígenas. “Ele vai desenhando isso em um caderno, faz estudos sobre essas formas e depois ele as transpõe para suportes materiais, em geral, papéis artesanais. Então, é um longo trabalho, bastante contínuo, que a gente entende como um verdadeiro inventário do patrimônio imaterial yanomami”, disse Ribeiro.

A obra desse artista é marcada pela memória oral e resgata as tradições ancestrais e os saberes cosmológicos de sua comunidade, localizada na cidade de Alto Orinoco, na Amazônia venezuelana. Por ser produzido sobre papéis artesanais, o trabalho enfrenta o tempo e discute, ao mesmo tempo, o papel da preservação dos materiais e também da cultura indígena.

“Acho que a principal discussão que existe, a partir dessa materialidade do suporte que ele utiliza, está relacionada a uma provocação para a sociedade não índigena em relação ao cuidado que se deve ter com aquilo que faz parte da identidade desse povo indígena e dos povos indígenas em geral. É uma reflexão bastante sofisticada sobre a perecibilidade”.

Sky Hopinka

Já na sala de vídeo do Masp são apresentados dois trabalhos de Sky Hopinka, que discutem sobre a identidade indígena contemporânea nos Estados Unidos. A curadoria é de María Inés Rodríguez, curadora adjunta de Arte Moderna e Contemporânea do Masp.

Sky Hopinka é um artista visual que, por meio de seu trabalho de vídeo, foto e texto, expressa a sua opinião sobre a paisagem e a terra indígena, utilizando de meios de comunicação pessoais, documentais e não ficcionais.

“Sky Hopinka é um artista bastante jovem e que começou a fazer filmes. Para ele é muito importante falar sobre sua identidade, sobre a identidade indígena contemporânea, sobre as tradições de sua comunidade e, ao mesmo tempo, sobre como essas tradições evoluíram e mudaram com o tempo. Então ele quer falar do mundo contemporâneo em que ele cresceu e em que ele vive e que se manifesta por meio de seus filmes”, explicou a curadora.

O primeiro vídeo é Kicking the clouds, onde o artista reflete sobre seus descendentes e ancestrais, guiado por uma gravação de áudio de 50 anos atrás de sua avó aprendendo a língua pechanga com sua mãe.

Já o segundo vídeo é Mnemonics of Shape and Reason, que percorre a memória de um lugar visitado pelo artista. Ele sobrepõe e remonta paisagens rochosas do deserto com uma trilha composta por textos e músicas, criando um relato rítmico das implicações espirituais da colonização.

Segundo a curadora, ambos os trabalhos são baseados na paisagem, na música e na linguagem, e traduzem as tradições e práticas ancestrais que sobreviveram aos sistemas de opressão. “Em seus filmes se nota como a presença da música é importante e também como representa as lutas contemporâneas por território e pela defesa da natureza. A música está sempre presente não somente contando uma história particular, mas também acompanhando as histórias que Sky quer compartilhar com o público”, disse.

Em seus vídeos, o cineasta conta histórias que remetem à sua identidade e aos modos de vida indígenas, mergulhando profundamente em questões de sua origem por meio de narrativas autobiográficas que se comunicam diretamente com o público nativo, sem a obrigatoriedade de explicar o significado aos espectadores não nativos. A base de sua obra é a etnopoética, explicou a curadora.

“A etnopoética é uma referência tomada do escritor e tradutor Eliot Weinberger. Esse conceito evoca a ideia do sujeito que é filmado e decide tomar a câmara para filmar, expressar e dizer o que ele quer que os outros saibam dele. Ou seja, o sujeito decide ser aquele que fala por si mesmo”, disse.

“Os dois filmes têm uma estética muito especial para trabalhar a paisagem e a cor e combiná-las com o som e a música. Isso me pareceu muito poético e por trás disso há também um compromisso político importante porque ele conta sua história e a história da comunidade a que ele pertence e que se situa no contexto de opressão e repressão às comunidades indígenas nos Estados Unidos”, acrescentou.

A mostra Sala de vídeo: Sky Hopinka fica em cartaz até o dia 13 de agosto, no segundo subsolo do museu.

O Masp tem entrada gratuita todas as terças-feiras e todas as primeiras quintas-feiras do mês.

Outras informações sobre as exposições podem ser obtidas no site do museu.

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