Hoje vamos conversar um pouco sobre economia. Os assuntos dentro desse campo são vários e a pauta econômica mundial continua sendo conduzida em função da crise econômica mundial. Mais do que um sentimento financeiro que foi muito bem dimensionado no último ano com o monumental tombo do mercado financeiro, este ano as coisas parecem caminhar para um outro perigoso caminho: o das mudanças e impactos no aspecto produtivo. As notícias nos jornais e revistas alertam para um ano de muitos desafios e mudanças. E agora?
O que mais existe de negativo e que melhor expressa esta questão são as demissões que começam a seguir aqui e acolá. Nesse meio tempo, um de nossos grandes guardiões da economia, mais conhecido como Comitê de Política Monetária (COPOM, para os íntimos), surpreende com um corte de 1% na taxa Selic, que baliza as taxas de juros do mercado financeiro, agora em 12,75% ao ano.
Será que finalmente o Banco Central percebeu o quanto a crise financeira contaminou os demais setores do país? Sinceramente, acho que não. Esse corte foi mais no sentido de atender um apelo da mídia e do próprio Presidente Lula – que alguns dias antes havia se comprometido em trabalhar em busca do corte.
Sempre que pensamos em crise e recessão, o perigo inflacionário fica estacionado. Ou seja, nesse momento específico a inflação não é considerada um problema real e imediato. Minha opinião é clara: nossa taxa ainda está muito alta. Ah, sim, ainda somos o país com a taxa de juros real mais alta do mundo. E muito alta para um país que de fato se preocupa em enfrentar momentos de crise.
A Selic e o consumidor
Como você deve imaginar, a taxa Selic para o consumidor final tem um reflexo praticamente irrisório, visto a disparidade dessa taxa e a cobrada pelo mercado financeiro sobre linhas de crédito, cartão de crédito, cheque especial e por aí vai.
Os bancos e financeiras utilizam o termo spread para definir a diferença entre o que o banco teria de custo de oportunidade do dinheiro (o que faria com ele sem risco) e a taxa cobrada de juros. E como fica fácil perceber, essa foi (é) uma mina de ouro para os bancos – que já alertaram que o spread não vai cair este ano.
A inadimplência preocupa
Entretanto, alguns reflexos negativos dessa “farra financeira” começam a aparecer. O nível de endividamento das pessoas ultrapassou o limite do tolerável e com ela chegou o aumento da inadimplência. Como não canso de repetir, crédito fácil no Brasil é sinônimo de crédito caro.
As pessoas não perceberam, especialmente diante das oportunidades de consumo, que o custo dos empréstimos ia muito além do valor que recebiam pela linha de crédito. E foram se enveredando pela compra de carros novos, equipamentos eletrônicos, financiamento habitacional etc. Tudo sem o mínimo de inteligência financeira.
Hoje já sabemos que a inadimplência da pessoa física é a maior desde 2002. A taxa de inadimplência do crédito do sistema financeiro brasileiro subiu para 4,4% em dezembro, informou o Banco Central. Em novembro, esse indicador estava em 4,2%.
O que chama a atenção dentro desse universo de inadimplência é o setor automobilístico, com o maior índice de atraso de pagamentos desde que se iniciou essa medição. O dado concreto é que parcelas em atraso com mais de 3 meses chegam à impressionante cifra de R$ 3,5 bilhões. Será que o tão temido “subprime do setor automobilístico” está chegando?
Com a perspectiva de desemprego que se desenha para o ano de 2.009, será que as pessoas conseguirão manter as contas em dia ou irão se preocupar em manter o básico para sobreviver? Há quem diga, por exemplo, que a inadimplência de cartões de crédito irá se elevar consideravelmente neste ano.
A lição: mais uma vez nossa cultura em momentos de bonança não foi a de que devíamos nos precaver e formar uma boa reserva financeira para os momentos difíceis (que sempre chegam). Como pessoas físicas, não poupamos ou nos preocupamos com o futuro – simplesmente nos deixamos conduzir ao poço sem fundo do consumismo sem controle.
O que podemos fazer? O que há de mudar?
Primeiro, os juros básicos precisam continuar caindo para que de fato possam influenciar a economia real e o mercado produtivo. Segundo, o governo precisa de fato entender que o momento é de grande preocupação. Temos que diminuir o tamanho da máquina pública imediatamente. Cortar gastos de custeio e pensar nos investimentos produtivos – principalmente em infra-estrutura.
E, finalmente, deve ser executada uma redução da carga tributária. Não podemos pagar juros de agiotas e impostos altíssimos para serviços tão precários e de péssima qualidade. 2009 será um ano muito diferente de qualquer dos cinco anos passados. Entretanto, essa freada mundial pode servir para colocar o Brasil em posição de competitividade ainda maior que antes da crise, pois com crises surgem grandes oportunidades.
Mais do que nunca é importante cobrarmos uma posição correta e inteligente de nosso governo.
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Ricardo Pereira é educador financeiro e palestrante credenciado pelo Instituto DiSOP, trabalhou no Banco de Investimentos Credit Suisse First Boston e edita a seção de Economia do Dinheirama.
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