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Presentear: um ato de amor ou uma armadilha de consumo?

por Conrado Navarro
3 min leitura
Presentear: um ato de amor ou uma armadilha de consumo?

Vamos imaginar grandes lojas de varejo e comerciantes que vendem brinquedos durante o ano todo. A época de final de ano é especial e reconhecida por ter suas vendas aquecidas pelos desejos das crianças e pela maior insistência das fabricantes através de campanhas publicitárias em decorrência das compras de Natal.

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Pense como um empresário do ramo. Vamos vender o máximo possível agora e simplesmente fechar a loja em janeiro e fevereiro, ainda mais no Brasil, em que “as coisas só voltam a funcionar depois do Carnaval?” ou, se falamos do fabricante, vamos fechar a fábrica depois do período das compras de Natal? Claro que não, afinal de contas é preciso vender, faturar e “girar” o estoque (e a produção) todos os meses.

Somos programados para comprar?

Sabe o que acontece? Os pais são programados para comprar presentes no Natal e também depois da passagem do ano, ainda que estejam em condições financeiras mais frágeis ou mesmo sem dinheiro. Isso mesmo! Estes pais são induzidos, por uma norma social, a comprar nas duas ocasiões.

Como assim? É simples: as fabricantes de brinquedos lançam novidades fantásticas nesta época e “bombardeiam” as crianças com propagandas sobre elas. Provocam os pequenos a ponto de eles desejarem incondicionalmente tais brinquedos e pedirem aos pais que eles sejam dados no Natal.

Eis que os mesmos fabricantes começam a entregar os brinquedos para as lojas, mas em quantidades menores do que a demanda. As novidades se esgotam rapidamente, mas muitas outras opções (não aquelas que as crianças desejam) permanecem disponíveis. A esta altura os pais já prometeram aos seus filhos fazer de tudo para que o Papai Noel traga a grande novidade – e quebrar essa promessa não parece uma boa ideia.

O compromisso é confrontado com a escassez. O resultado?

Os pais ouvem o discurso padrão de que “a novidade vendeu tanto que se esgotou”, mas não podem ir para casa de mãos vazias. Eles acabam comprando outros presentes para o Natal, quase sempre gastando um valor semelhante ao que gostariam de ter dado (de uma certa forma, querem “compensar” o filho pela “falha”).

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Chega o Natal, os filhos ganham muitos presentes, se divertem, mas fazem questão de lembrar os pais de que aquele não foi o “acordo”. Cobram a grande novidade e carregam os pais de culpa em um momento recheado de fortes cargas emocionais. Aquilo fica na cabeça desses pais por algum tempo.

O que acontece em janeiro e fevereiro? A novidade prometida para o Natal volta às lojas, com um preço mais interessante, oferecido quase que como um “achado”. Os pais vão imediatamente comprar o brinquedo e o levam para casa felizes por poder honrar o combinado com os filhos semanas atrás. E gastam dinheiro para isso – por vezes, um dinheiro que eles não têm. Em pouco tempo, os pais gastaram muito dinheiro (e garantiram o Natal e o início de ano das lojas e fabricantes de brinquedos).

Compromissos exigem coerência

Vamos recapitular? Logo que a novidade foi lançada, os filhos bombardearam os pais com seus pedidos para as compras de Natal. Cena comum, os pais tomaram nota do desejo dos filhos e prometeram correr atrás de seu desejo. Neste momento, pais e filhos firmaram um compromisso, selaram um acordo.

Vocês notaram o que aconteceu nesta história? Os pais simplesmente agiram com coerência! Ao se comprometerem com seus filhos, os pais simplesmente buscaram honrar o acordo, o que é um ato social comum e desejável na nossa sociedade – cumprir uma promessa é ser coerente e considerado de bom grado.

Conclusões

Calma! Antes de sentir-se lesado e enganado, entenda que as normas sociais usadas para nos fazer consumir mais são também responsáveis por relacionamentos melhores e maior sinceridade na relação familiar. Compromisso e coerência são aspectos muito importantes e positivos do caráter de uma pessoa. Ponto.

O aspecto central da história contada hoje é outro: nosso processo de tomada de decisões envolve aspectos subjetivos e emocionais em cargas muito elevadas. Basta se lembrar de que muitas vezes nos endividamos além da conta para satisfazer promessas e compromissos, quando o correto seria respeitar os limites e lidar com a frustração.

Daí que o problema não é comprar agora e comprar de novo, mas sim definir prioridades em conjunto com a família – de modo que consumir será sempre natural e desejável desde que os objetivos principais da família sejam respeitados antes, durante e depois dos apelos de consumo. Não é fácil, mas isso você já entendeu. Boa sorte.

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