Carolina comenta: “Navarro, no final do ano passado conversei muito com minha família sobre as necessárias mudanças nos nosso estilo de vida em decorrência da queda dos juros, pouca rentabilidade dos investimentos e as muitas compras parceladas que fazemos. Confesso que está bem difícil abordar isso, parece que há algo enraizado na nossa cultura. Aborde isso em algum texto. Obrigada”.
É cada vez mais comum nos textos de especialistas de finanças o alerta para o perfil do investidor. Seu comportamento e suas escolhas precisam mudar e acompanhar as mudanças nos juros básicos da economia e seus reflexos na rentabilidade dos investimentos conservadores. A mudança, no entanto, não é fácil.
Uma pesquisa realizada pelo Instituto Rosenfield no final do ano passado, a pedido da BM&F Bovespa, aponta os desafios que temos pela frente. Duas mil pessoas das 15 maiores regiões metropolitanas brasileiras (100 municípios) e de todas as classes sociais participaram. Os resultados?
- 52,6% dos brasileiros preferem investimentos com baixo risco e alta rentabilidade;
- 26% afirmam ter um perfil “moderado”;
- Apenas 7% tem propensão e interesse em realizar aplicações de alto risco e alta rentabilidade;
- Os demais não souberam ou não quiseram responder.
Um dado chama atenção: mais da metade dos entrevistados (53,4%) afirmou que não sobra dinheiro para investir. Ainda assim, a pesquisa também questionou os participantes sobre suas principais opções de investimento (onde está o dinheiro dos participantes):
- A caderneta de poupança é o investimento mais usado, com 44,4% dos recursos aplicados;
- A conta corrente vem em segundo, com 37%;
- Os imóveis aparecem com 3,7%;
- Títulos de capitalização, 3,3%;
- Ações com apenas 1%;
- CDB com 0,8%;
- Fundos de renda fixa com 0,6%;
- Fundos DI com 0,6%;
- Ouro com 0,6%;
- Tesouro Direto com 0,5%;
- Fundos Imobiliários com 0,4%;
- ETF com 0,1%.
Certo, mas como e com quem aprendem esses brasileiros que são muito conservadores? Trata-se de ignorância financeira pura e simples ou há um aspecto cultural envolvido? A principal fonte de informação dos brasileiros são os familiares, os amigos e os conhecidos, com 47,2%. Os jornais apareceram em segundo lugar, com 9,2%. Ou seja, há um forte componente social envolvido em nossas decisões.
Os resultados não são reveladores. Pelo contrário, relatam exatamente a postura que tanto queremos melhorar com a educação financeira e que tanto insistimos neste espaço. Três aspectos merecem atenção neste sentido:
1. A percepção de risco
O mesmo brasileiro que é conservador com a decisão de investir seu dinheiro por vezes opta por fazer longos e pesados financiamentos, muitos deles capazes de “estourar” seu orçamento e levá-lo ao endividamento. Faz sentido?
O jornalista Fernando Torres, do excelente blog “Casa das Caldeiras”, acrescenta: “O medo de perder o dinheiro principal acumulado ao longo do tempo – mesmo que a quantia seja pequena – é muito maior do que o de ficar inadimplente de uma dívida ‘n’ vezes maior. Assim como acontece com as pessoas que tem dinheiro na poupança, mas devem no cartão de crédito ou cheque especial”.
2. Conservadorismo nos investimentos
A caderneta de poupança anda “perdendo” para a inflação. Isso significa que sua rentabilidade é menor que a variação dos preços medida pelo IPCA, índice oficial usado para medir a inflação. Trocando em miúdos, ao manter dinheiro na caderneta de poupança você está perdendo poder de compra.
Isso não significa que você deve tirar todo o seu dinheiro de lá, mas que será necessário rever seus investimentos de uma forma mais inteligente, com foco no tempo de aplicação e relacionando as aplicações com objetivos bem definidos. Só assim será possível aplicar recursos em modalidades mais arrojadas sem “perder o sono”.
Abordei esta questão em meus dois últimos artigos, “A inflação, você e suas decisões de investimentos em 2013” e “Investimentos para um futuro melhor: foco na inflação e nos juros”.
3. Educação financeira como cidadania
Aqui voltamos ao que considero mais importante dentro de todo esse cenário econômico desafiador que vivemos: a educação financeira é algo que passamos aos outros através de nossos atos, nossas decisões e escolhas. Ao contrário do que muitos pensam, ela não pode ser apenas uma disciplina ensinada na escola.
Pais absolutamente alheios à necessidade de planejar suas finanças, que costumam se endividar com frequência e acham que dinheiro é sinônimo de problemas perpetuam uma imagem negativa sobre educação financeira. Não por querer, mas simplesmente por existir.
A força dos exemplos, o diálogo e, principalmente, o cuidado com o dinheiro no dia a dia é o que criarão (ou não) uma geração financeiramente mais inteligente, pró-ativa e preparada.
Por fim…
Se você se identificou com os resultados da entrevista apresentada, fique tranquilo. A realidade geral é essa mesmo, mas perceba que você tem algo fundamental e muito pouco presente nos números vistos aqui: você busca conhecimento fora dos meios tradicionais, é mais interessado que a multidão e deseja aprender.
Ótimo, parabéns! Agora é hora de colocar em prática as tantas reflexões que você vem fazendo sobre como investe seu dinheiro, quais são suas metas para as aplicações que já possui e sobre a necessidade de equilibrar melhor as finanças domésticas. Boa sorte e sucesso!
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