A decisão unânime do Banco Central pela interrupção do ciclo de cortes da taxa básica de juros era amplamente esperada e não deve dificultar a relação com o governo de cotados para a presidência da autoridade monetária que já fazem parte da diretoria, avaliaram três fontes do governo.
Na quarta-feira, o BC decidiu manter a Selic em 10,50% ao ano com voto favorável dos quatro diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, marcando uma mudança de posição, já que na reunião de maio eles haviam divergido do restante do grupo e votado por uma flexibilização monetária maior.
Dois dos diretores, Gabriel Galípolo e Paulo Picchetti, são considerados cotados para suceder Roberto Campos Neto na presidência da autarquia a partir de 2025.
Uma fonte do ministério da Fazenda avaliou, sob condição de anonimato, que a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) não cria indisposição de nenhum dos quatro diretores indicados por Lula para o BC.
Uma segunda autoridade da equipe econômica avaliou como positiva a decisão unânime, argumentando que a coesão do colegiado reduz ruídos após a turbulência gerada no mercado pela divergência na reunião de maio.
Para uma terceira fonte, do Palácio do Planalto, a decisão não foi uma surpresa. Ela avaliou que Lula fez o cálculo político de subir o tom contra o BC exatamente por considerar esse provável cenário de manutenção da Selic.
Na véspera da decisão do Copom, Lula acusou Campos Neto de trabalhar para prejudicar o país, sinalizando que indicará um sucessor para o cargo de chefe da autarquia que seja “sério, responsável e imune aos nervosismos momentâneos do mercado”.
Para essa fonte do Planalto, o presidente decidiu “dizer o que precisava ser dito” para marcar posição política sobre os juros, mas também por desconforto após Campos Neto ter se encontrado mais de uma vez nas últimas semanas com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, cotado pela direita para uma possível candidatura à presidência da República.
Essa fonte, porém, acredita que o voto dos diretores indicados por Lula, alinhados ao restante do colegiado em visão dura em relação aos juros, não comprometerá a relação com o presidente.
Outra autoridade da Fazenda, apesar de defender que havia espaço para um corte de 0,25 ponto percentual nos juros básicos, avaliou que a unanimidade serve como escudo para a diretoria, que teve a decisão criticada não apenas por Lula, mas por representantes da esquerda e do setor produtivo.
Nesta quinta-feira, em entrevista à rádio Verdinha, em Fortaleza, Lula lamentou a interrupção nos cortes de juros pelo BC e afirmou que o povo brasileiro é quem mais perde com a decisão. Ele não fez comentários específicos sobre diretores indicados pelo atual governo.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou na quarta-feira que vai aguardar a divulgação da ata da reunião do Copom, na próxima terça-feira, para tecer comentários mais profundos sobre a Selic.
“Tenho confiança nas pessoas indicadas (para o BC). Vamos seguir um rumo forte da economia”, disse, na ocasião.