Renan comenta: “Navarro, me casei há 3 anos, tenho um apartamento e um carro, ambos financiados. Minha esposa perdeu o emprego e está difícil honrar com as prestações. O carro já estou tentando vender, mas fico indignado com os valores baixos que as lojas e alguns particulares querem me pagar. Tem amigos dizendo que devo também tentar vender o apartamento, me livrar do financiamento e morar de aluguel, mas aí eu não concordo. O que me diz?”
O financiamento é algo que tomou conta da rotina financeira de muita gente. Quando as pessoas vêm conversar comigo sobre suas finanças e eu pergunto se elas tomaram algum empréstimo, normalmente ouço algo assim: “nunca fiz nenhum empréstimo. O que tenho é um financiamento…” Existe mesmo diferença?
Empréstimo ou financiamento?
Quando falamos de empréstimo, algo ruim soa em nossa mente, e isso tem um motivo. Antigamente, todos os empréstimos eram associados a algum tipo de bem, que era dado como garantia de pagamento. O objetivo de quem emprestava era estender ao máximo o prazo de pagamento para usufruir dos juros embutidos no processo.
Era comum as pessoas não conseguirem honrar as prestações e, assim, perderem alguns bens (aqueles que foram dados como garantia do empréstimo). E com o aumento desses casos, a palavra empréstimo ficou associada às perdas de patrimônio, falências e coisas do tipo.
Com o passar do tempo, surgiu o conhecido financiamento. Numa analise simples, um financiamento é idêntico a um empréstimo. A diferença é que ao fazer um empréstimo, você recebe o dinheiro e faz o que quiser com ele, enquanto no financiamento o dinheiro é dado diretamente para a empresa que está te vendendo o bem (concessionária, no caso de um carro, ou incorporadora, no caso de um imóvel, por exemplo).
Dessa forma, o financiamento utiliza o próprio bem que está sendo comprado como garantia de pagamento. Se você deixar de pagar as prestações, a instituição financeira poderá “tomar” o bem financiado. Como vemos, as diferenças são mínimas em relação a um empréstimo convencional.
Financiar é bom ou ruim?
Isso depende dos seus objetivos. Se você está financiando um bem que se tornará um gerador de renda para você (um ativo), então está fazendo algo bom. Mas se estiver financiando um bem que só vai se depreciar com o tempo e ainda consumir mais dinheiro (um passivo), então é um negócio ruim.
Financiar um carro apenas para uso particular, sendo que você não usará este veículo para gerar mais renda, não é algo recomendado, pois além das prestações e seus altíssimos juros, você ainda terá várias outras despesas (impostos, manutenção, combustível, pedágios, estacionamentos e por aí vai).
Leitura recomendada: Carros: planilha (gratuita) para você controlar os gastos – cada vez maiores no Brasil
Por outro lado, se você colocar este carro para “trabalhar” para você, seja de forma direta (prestação de serviços como o Uber, por exemplo) ou indireta (instrumento para gerar renda ou aumentar a renda existente em outros negócios), então o financiamento faz sentido. Tenha o cuidado de calcular tudo direitinho para não ter surpresas.
Se você tem um carro financiado, ele é um passivo e você não está conseguindo pagar as prestações, o melhor a fazer é vendê-lo, ainda que você tenha prejuízos. Se a financeira tomar seu veículo por motivos de inadimplência, as perdas serão ainda maiores (e esse é um risco conhecido desde a contratação do financiamento).
Leitura recomendada: Carros: o consumidor está endividado demais?
O clássico caso dos imóveis
Se o financiamento de veículos já gera alguma divergência de opiniões, quando o assunto é financiamento imobiliário a coisa fica ainda mais complexa.
Via de regra, a situação é a mesma em relação ao conceito de ativos e passivos, mas para os imóveis temos um complicador: vivemos perfeitamente bem sem carro, damos um jeito, mas sem ter onde morar a coisa fica mais tensa.
Para analisar se vale a pena vender um imóvel financiado para diminuir o endividamento, deve-se avaliar o quanto você conseguiria se capitalizar ao vender o imóvel, seja com a transferência da dívida ou mesmo negociando o valor cheio para quitar o restante do financiamento.
A questão é simples: quanto você vai ter na mão se decidir vender o imóvel financiado? Ah, também precisa avaliar o valor do aluguel em relação ao valor das prestações e constatar se haveria mesmo um alívio financeiro, além de apurar se haverá imposto a ser pago (ganho de capital).
Leitura recomendada: Imóvel: comprar ou alugar?
Quem tem bens financiados ainda não tem patrimônio, afinal eles só serão de fato do comprador quando estiverem totalmente pagos. Quando alguém recomenda a venda tanto de um carro quanto de um imóvel, tem a visão de converter estas dívidas em algum patrimônio real, ainda que pequeno, e isso é algo válido.
Este passo costuma funcionar bem como ponto de partida para uma reorganização das finanças familiares diante do novo quadro de desemprego, além de ser uma reserva de emergência já formada.
O fato é que a economia é dinâmica, com momentos de juros altos e crise (como agora), em que é mais interessante pagar aluguel do que comprar um imóvel (financiado ou não); e com outros momentos em que os juros estarão baixos, momento propício para comprar um imóvel, considerando suas chances de valorização e os juros menores envolvidos na compra.
De forma geral, não recomendo que as famílias se desfaçam de imóveis financiados, mas esta é uma análise que deve ser feita caso a caso, usando os parâmetros discutidos acima.
Leitura recomendada: Imóvel: Alugar ou Comprar, qual é a Melhor Opção?
Conclusão
O importante é que tenhamos conhecimento suficiente para avaliar todas as opções e tirarmos nossas próprias conclusões em função das particularidades de nossas vidas financeiras, e também em relação aos nossos valores de vida. Por isso a educação financeira sempre será algo relevante para todos, mas subjetivo.
Foto “getting financial”, Shutterstock.