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Afinal, o cultivo de eucalipto é mesmo prejudicial ao meio ambiente?

O eucalipto e o pínus são cultivados em escala industrial em diferentes regiões do Brasil para a extração de celulose e madeira e a produção de papel

por Agência Senado
3 min leitura
Arvores de Eucalipto

Não tem como a resposta ser taxativa: depende. O impacto das plantações de eucalipto e pínus no meio ambiente pode ser positivo ou negativo, segundo especialistas ouvidos pela Agência Senado, a depender de como e onde as árvores são cultivadas.

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Quando a técnica e o local são apropriados, os cultivos florestais produzem relativamente poucos impactos negativos e podem até mesmo ter efeitos positivos. Recuperam áreas degradadas de pastagem, capturam carbono da atmosfera e protegem a fauna do entorno.

Por outro lado, quando a técnica e o local são inadequados, os efeitos ambientais podem ser devastadores. As plantações florestais corroem o bioma nativo, prejudicam a fauna e comprometem a disponibilidade de água.

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O eucalipto e o pínus são cultivados em escala industrial em diferentes regiões do Brasil para a extração de celulose e madeira e a produção de papel, embalagens, móveis, pisos, painéis e carvão vegetal, por exemplo.

As duas árvores são espécies exóticas, isto é, não são brasileiras. O eucalipto é nativo da Oceania. O pínus, um tipo de pinheiro, vem das Américas do Norte e Central.

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A opção por essas espécies estrangeiras se explica pelo fato de crescerem com rapidez e alcançarem alturas notáveis. Nesses quesitos, as árvores nativas do Brasil não conseguem competir. O eucalipto atinge 40 metros de altura e leva sete anos para chegar ao ponto de corte.

Nos últimos meses, esse setor produtivo ganhou dois grandes incentivos. Em março, o Ministério da Agricultura lançou uma versão atualizada do Plano Nacional de Desenvolvimento de Florestas Plantadas, com medidas para ampliar os cultivos no Brasil.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, participou do evento de lançamento ao lado do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro.

Em maio, o Senado e a Câmara aprovaram e, em junho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou uma lei que retirou as plantações florestais da lista de atividades econômicas com potencial poluidor (Lei 14.876, de 2024).

Com a medida, a burocracia se reduziu e as empresas de silvicultura não precisam mais pagar ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental.

Muitos especialistas condenam o uso da palavra “floresta” para se referir a essas plantações. A floresta propriamente dita, afirmam eles, compõe-se de inúmeras espécies de árvores e outras plantas, o que cria o habitat ideal para uma variedade de animais.

A plantação florestal, em vez disso, é um ambiente homogêneo, composto de uma única espécie. Ou seja, não oferece as condições necessárias para o desenvolvimento da fauna ou de uma flora associada. É uma lavoura destinada à exploração comercial, não muito diferente da monocultura da soja, do milho ou da cana-de-açúcar.

Por essa razão, para entender o impacto das plantações florestais no meio ambiente, a comparação não deve ser com florestas nativas. As florestas, claro, sempre serão ambientalmente melhores que os cultivos florestais.

As plantações florestais podem ser comparadas com os demais cultivos agrícolas. E nessa comparação, as plantações florestais têm uma série de vantagens ambientais — diz o engenheiro agrônomo e florestal Edilson Batista de Oliveira, pesquisador da Embrapa Florestas (unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, do Ministério da Agricultura).

O eucalipto e o pínus normalmente são plantados em áreas de pastagem degradada. Mais especificamente, em terras que na origem eram florestas nativas, em seguida foram derrubadas para dar lugar ao pasto e no fim, em consequências de técnicas agropecuárias equivocadas, se deterioraram ao ponto de ficarem imprestáveis para o próprio gado e a lavoura.

As plantações florestais, diferentemente de outras plantações, conseguem crescer em terrenos arenosos e pobres e auxiliam na restauração ambiental com os seus galhos, folhas e raízes, que incorporam matéria orgânica ao solo — explica Oliveira.

Além disso, as árvores retiram do ar e armazenam o dióxido de carbono [gás do efeito estufa que contribui com as mudanças climáticas], serviço ambiental que a pastagem degradada praticamente não faz. As plantações florestais, por essas razões, dão uma contribuição fantástica ao meio ambiente.

Há mais vantagens. Os cultivos florestais se desenvolvem em terrenos bastante íngremes e consomem bem menos agrotóxicos do que as demais lavouras.

De acordo com o pesquisador da Embrapa, o setor responde por apenas 0,04% dos defensivos agrícolas utilizados por todo o agronegócio brasileiro. Além disso, passam-se muitos anos sem que haja colheita nem replantio.

Da mesma forma que qualquer empreendimento rural, as plantações de eucalipto e pínus são obrigadas pelo Código Florestal (Lei 12.651, de 2012) a destinar uma parcela da terra à conservação ambiental, e não à exploração, por meio de reservas legais e áreas de preservação permanente.

O engenheiro agrônomo Pedro Brancalion, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP), afirma que a silvicultura é o setor do agronegócio que mais respeita as leis ambientais:

O setor de celulose, papel e madeira é muito vigiado. Esses produtos não podem ser exportados se não tiverem uma série de certificações ambientais. Diante de tamanha pressão, o setor, no geral, cumpre a legislação.

As propriedades quase sempre têm vegetação nativa, tanto conservada quanto em restauração, ao lado dos eucaliptos ou dos pínus. Os níveis de vegetação protegida são os maiores do agronegócio.

Arvores de Eucalipto
(Imagem: (Geraldo Bubniak/AEN)

Segundo Brancalion, as plantações florestais permitem o deslocamento de algumas espécies de animais silvestres entre um fragmento de floresta nativa e outro.

Ele destaca o muriqui (tipo de macaco) e o lobo-guará entre os animais que fazem uso dos “corredores” de eucalipto no interior do estado de São Paulo.

Ele continua:

Costuma-se ter uma visão negativa dos cultivos florestais, chamados de desertos verdes, mas permissiva em relação aos pastos degradados. Na realidade, os verdadeiros desertos verdes são esses pastos, que estão exauridos, compactados e erodidos, assoreiam os cursos d’água e não geram benefício econômico.

A pecuária é o setor mais envolvido em desmatamento. Bichos florestais evitam os campos abertos, e isso representa um risco para a sobrevivência deles. A mudança de uso do solo, de pasto degradado a plantação florestal, com frequência traz ganhos ambientais.

A favor das plantações florestais, também está o fato de que elas aliviam a pressão sobre as florestas nativas. Para produzir móvel e papel, por exemplo, os empresários podem recorrer aos cultivos comerciais, e não à madeira extraída ilegalmente das matas. O professor da USP afirma:

Com frequência, vemos nas mensagens de e-mail uma frase do tipo “proteja as árvores e não imprima esta mensagem”. Isso é uma tolice. É claro que temos que evitar o desperdício de recursos naturais, mas essas árvores foram plantadas comercialmente com o fim de ser transformadas em papel.

Não se trata de árvores nativas. A produção e o consumo do papel não contribuem com a derrubada das florestas para esse fim.

Mesmo as plantações florestais não comerciais têm o poder de proteger as matas nativas. Os pequenos cultivos de eucalipto têm sido cada vez mais utilizados por fazendeiros com o intuito de obter madeira para uso como cerca ou combustível de fogão a lenha, garantir sombra para o gado ou proteger uma lavoura convencional do vento e das altas temperaturas.

Os incêndios que se espalharam pelo Brasil nas últimas semanas afetaram florestas nativas, mas não plantações florestais.

Por serem um negócio, os cultivos de eucalipto e pínus são fortemente vigiados pelas empresas de modo a impedir que as árvores sejam queimadas e o investimento e o lucro sejam comprometidos.

O Brasil tem uma das maiores áreas de plantações comerciais de árvores do mundo. São 10,2 milhões de hectares ocupados por eucaliptos, pínus e outras espécies o dobro da área do Distrito Federal ou a metade da área de Sergipe.

No ano passado, a cadeia produtiva florestal movimentou mais de R$ 202 bilhões brutos e respondeu por quase 1% do produto interno bruto (PIB) do Brasil, de acordo com a Indústria Brasileira de Árvores (IBA), entidade que representa as empresas do setor.

Enquanto a maior parte do papel produzido tem o mercado interno como destino, a maior parte da celulose extraída vai para para o mercado internacional. O Brasil é o maior exportador mundial de celulose.

Os especialistas ouvidos pela Agência Senado reconhecem a importância da silvicultura para a economia brasileira, mas dizem que as autoridades não podem fechar os olhos para as plantações florestais que, feitas com técnicas ruins ou em regiões inadequadas, produzem danos ao meio ambiente.

O engenheiro agrônomo Pedro Brancalion explica que a água é o combustível que faz o eucalipto crescer rápido e chegar aos 40 metros de altura.

Por isso, os produtores precisam tomar cuidados técnicos para que as plantações não consumam toda a água disponível na região, o que pode afetar o lençol freático e as nascentes.

Ele explica que, na época da seca, as árvores brasileiras se adaptam à falta de água perdendo as folhas e interrompendo o crescimento, mas os eucaliptos continuam se desenvolvendo normalmente, como se não houvesse estresse hídrico. Isso ocorre porque eles têm raízes profundas, que podem chegar ao lençol freático.

Em termos produtivos, isso é ótimo. Em termos ambientais, é péssimo — avalia Brancalion.

Além de esvaziar o lençol freático e as nascentes, as plantações malfeitas de eucalipto ressecam a terra, provocam erosão, empobrecem o solo e assoreiam cursos d’água. 

Para mitigar o problema, ainda de acordo com ele, cidades da Bahia onde o eucalipto é uma atividade econômica importante têm aprovado leis que impõem uma área máxima do município que as plantações podem ocupar.

Quando esse limite é atingido, as empresas não podem plantar nem um palmo mais de eucalipto — afirma.

As plantações florestais também representam uma ameaça ao meio ambiente quando são introduzidas em biomas de vegetação rasteira, como o Pampa, o Cerrado (exceto o Cerradão, formação florestal do bioma) e os campos de altitude da Mata Atlântica.

De acordo com a engenheira florestal Ana Paula Rovedder, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Recuperação de Áreas Degradadas, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), os cultivos de árvores deveriam ser feitos apenas em biomas florestais:

Não se devem fazer grandes extensões de monocultivos florestais em áreas de ecossistema campestre porque isso afeta o bioma inteiro. A flora e a fauna evoluíram nesse ambiente de muita luz e vento intenso ao longo de milhares de anos.

As plantações florestais criam sombra e modificam a dinâmica de circulação de vento. As espécies vegetais e animais, que não são adaptadas às novas condições, correm o risco de sofrer extinção local, regional e até mesmo definitiva.

Rovedder cita como exemplo o gato-palheiro-dos-pampas. Existem hoje apenas 50 indivíduos dessa espécie, divididos entre os campos do Rio Grande do Sul, do Uruguai e da Argentina. Ela diz:

Esse é um felino que vive, caça e se reproduz no campo. Não é um animal de mata. Se os cultivos florestais continuarem a expansão no Rio Grande do Sul, o gato-palheiro-dos-pampas vai simplesmente desaparecer.

Certos répteis dos Pampas correm o mesmo risco. Como eles são responsáveis pela dispersão de sementes, espécies da flora poderão desaparecer com esses répteis. A mudança do tipo de ambiente é muito perigosa.

A pesquisadora da UFSM afirma que as plantações florestais foram beneficiadas por uma recente alteração da legislação ambiental do Rio Grande do Sul que facilitou a introdução de lavouras nos campos do estado que antes eram exclusivos para a pastagem do gado.

Não podemos continuar flexibilizando as leis nem as fiscalização ambiental. Estamos vendo o resultado disso com os nossos próprios olhos. Não estamos mais num tempo de mudanças climáticas. Já estamos num tempo de emergência climática.

De acordo com o engenheiro agrônomo Valério De Patta Pillar, professor do Departamento de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), não se sustenta o argumento das empresas de silvicultura de que os campos nativos em que elas pretendem estabelecer plantações de árvores seriam pastos degradados:

É um argumento enganoso. Os campos do Pampa e os campos de altitude da Mata Atlântica são secularmente utilizados como pastagem para o gado, mas nem por isso perdem a característica de vegetação nativa.

Do ponto de vista agronômico, eles podem até ser menos produtivos do que pastagens recém-plantadas, adubadas e manejadas adequadamente. Isso, entretanto, não transforma esses campos nativos em pastos degradados.

Pillar afirma que a população em geral ignora a importância ambiental dos campos nativos e as empresas se aproveitam disso:

As empresas de celulose não têm coragem de propor a expansão da silvicultura sobre florestas nativas, porque sabem que a população sabe que é importante preservar as florestas e vai reagir.

Mas têm coragem de avançar sobre áreas de campos nativos porque, como eles não têm matas, a população não os vê como importantes. Soma-se a isso, muitas vezes, a facilidade com que os próprios órgãos ambientais liberam a supressão de campos que deveriam ser tão protegidos quanto as florestas.

O biólogo e geocientista Fabrício Bau Dalmas, coordenador do mestrado em análise ambiental da Universidade Guarulhos (UNG), afirma que aos poucos a imagem negativa dos eucaliptos no Brasil vem mudando:

Na década de 1990, a maioria dos estudos científicos apontava problemas no eucalipto. Na época, o manejo era inadequado e as plantações acabavam com a disponibilidade de água. Nos últimos anos, a maioria dos estudos aponta benefícios.

O setor agrícola brasileiro evoluiu muito nas últimas décadas, incluindo as plantações florestais, e a produtividade disparou.

O Brasil se tornou referência para o mundo e tem condições de aumentar a produtividade do eucalipto e do pínus sem avançar sobre mais nenhuma área nova.

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