O Banco Central decidiu nesta quarta-feira reduzir o ritmo de afrouxamento monetário ao fazer uma redução de 0,25 ponto percentual na taxa Selic, a 10,50% ao ano.
O placar esteve dividido entre a ala “lulista” de diretores indicados pelo presidente da República, com 4 votos para 0,5 p.p., e a ala do presidente do BC, Roberto Campos Neto, com 5 votos para a decisão de 0,25 p.p..
Ou seja, é possível que a possibilidade de um final antecipado do mandato, com prazo até dezembro, de Campos Neto volte ao radar.
A autoridade monetária abandonou sua indicação sobre corte futuro nos juros básicos, afirmando que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade e expectativas desancoradas demandam maior cautela.
“O Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para 10,50% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante”, informou o Comitê de Política Monetária (Copom) em comunicado.
Sobre o cenário fiscal, o texto argumenta:
“O Comitê acompanhou com atenção os desenvolvimentos recentes da política fiscal e seus impactos sobre a política monetária. O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”.
Veja o comunicado do Copom
Racha do Banco Central
Conforme o comunicado, a decisão foi dividida, com o presidente Roberto Campos Neto e os diretores Carolina Barros, Diogo Guillen, Otávio Damaso e Renato Gomes votando pelo corte de 0,25 ponto.
Indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Ailton de Aquino Santos, Gabriel Galípolo, Paulo Picchetti e Rodrigo Teixeira votaram por uma redução de 0,50 ponto percentual.
Fritura de Campos Neto
Recentemente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já não tem escondido mais a sua insatisfação com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e iniciou uma “fritura” pública do economista em uma entrevista ao jornal Folha de S.Paulo publicada neste sábado (27).
Segundo ele está sendo “uma experiência extremamente complexa conviver com um presidente do Banco Central que você não escolheu”.
Indicado por Jair Bolsonaro, Campos Neto, permanece no cargo até dezembro de 2024. A Lei de Autonomia do BC, sancionada em fevereiro de 2021, garantiu mandatos fixos ao seu presidente e aos diretores em formato intercalado para um mandato de quatro anos, com direito a uma recondução.
Mudança de tom
Enquanto o cenário macroeconômico global se direcionava para a possibilidade de cortes de juros pelo Federal Reserve, e consequentemente abrindo espaço para a queda da Selic, Haddad atuava como um protetor de Campos Neto em relação à ala política do governo e do PT.
O cenário, contudo, mudou.
Os indicadores nos EUA agora indicam uma pequena chance de alívio monetário em 2024, ou até nenhuma alteração no juro. Esta percepção, aliada aos debates sobre as projeções para contas públicas do governo Lula, diminuiu as estimativas para os próximos cortes da Selic.
Saída antecipada
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse recentemente que ainda terá que decidir se vai antecipar a indicação do sucessor de Campos Neto ou se fará o anúncio mais próximo do fim do seu mandato.
Lula voltou a questionar a atuação de Campos Neto e a defender a redução dos juros.
“Eu tenho que indicar mais diretores e o presidente do Banco Central até o final do ano. Só tenho que decidir se vou antecipar ou se deixo para indicar o mais próximo possível do vencimento do mandato do Roberto Campos”, disse o presidente.
Haddad não é diretor do Banco Central, mas o seu amigo Gabriel Galípolo, indicado por ele para a diretoria de política monetária em junho do ano passado, é.
Galípolo e Haddad
Na ocasião da sua entrada no BC, o ministro disse que a sua indicação tinha o objetivo de aproximar as equipes dos dois órgãos e evitar ruídos de informações.
“O objetivo de Galípolo estar no Banco Central é aproximar as equipes, ter uma interação maior, trocar informações. Nem sempre as informações batem”, declarou.
Os laços de Galípolo, que foi vice de Haddad no Ministério da Fazenda, continuaram a ser cultivados depois da sua ida para o BC.
Segundo a Reuters, o diretor pega carona em voos da Força Aérea Brasileira (FAB) com o ministro de Brasília para São Paulo e participa de diversas reuniões informais no gabinete do ministério na capital paulista, entrando inclusive pela entrada privativa.
Galípolo também tem vínculos com Lula que independem de sua relação com Haddad devido à sua conexão com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, seu parceiro acadêmico de longa data, que atua há anos como conselheiro do presidente.
Alinhado ao presidente, Galípolo chegou a dizer na última quarta-feira (24) que possui uma opinião “radical” de que a autarquia não deveria ter direito a voto na determinação da meta de inflação no Conselho Monetário Nacional (CMN), defendendo que ela seja estabelecida pelo “poder democraticamente eleito”.
O diretor afirmou que não cabe à autarquia opinar sobre qual deveria ser a meta de inflação, argumentando que o mandato do BC é apenas perseguir a meta estabelecida.
Impacto do fiscal no custo da dívida
O Tesouro Nacional, talvez observando o mercado desfavorável desde janeiro, tem realizado leilões menores de títulos da dívida para evitar o salto dos rendimentos exigidos pelos investidores insatisfeitos com as incertezas da área fiscal do governo Lula.
Na terça-feira (7), o Tesouro optou por oferecer lotes pequenos de NTN-B, com os investidores adquirindo boa parte da oferta de 450 mil notas.
No entanto, apesar da queda nos juros dos títulos de 10 anos dos EUA (Treasuries), referência global, nas últimas duas semanas, o custo das emissões subiu.
Leilão de NTN-B
“Fatores domésticos, principalmente as incertezas fiscais, elevaram a rentabilidade das NTN-B”, analisa a MCM Consultores em um relatório publicado nesta quarta-feira (8).
A dívida pública bruta do país como proporção do PIB fechou março em 75,7%, contra 75,5% no mês anterior. Já a dívida líquida foi a 61,1%, de 60,9%.
É o maior patamar em dois anos, quando a dívida bruta estava em 76,3%. Naquele mês, em abril de 2022, encerrava-se a pandemia do coronavírus no Brasil. A dívida chegou a um pico de 87,6% em dezembro de 2020.
(Com Reuters)