Home Agronegócio MPF defende maior taxação sobre agrotóxicos na reforma tributária

MPF defende maior taxação sobre agrotóxicos na reforma tributária

MPF considera "contraditório" os agrotóxicos contarem com importantes benefícios fiscais, levando-se em conta seu potencial impacto à saúde

por Agência Senado
0 comentário

Representantes do Ministério Público, gestores e ativistas defenderam, em audiência na Comissão de Direitos Humanos (CDH) nesta quinta-feira (10), que os agrotóxicos sejam mais tributados no projeto da reforma tributária (PEC 45/2019), em análise no Senado.

A mesma posição foi defendida pelo presidente da CDH, Paulo Paim (PT-RS), que se colocou à disposição para apresentar emendas ao relator da reforma, senador Eduardo Braga (MDB-AM), assim como articular encontros com Braga visando o aprofundamento do debate sobre essa taxação específica.

Paim citou dados da OMS [Organização Mundial de Saúde] apontando que os agrotóxicos já causam diretamente cerca de 120 mil mortes por ano e 13 milhões de casos de intoxicação. O senador citou também dados recentes do Ministério da Saúde apontando que, entre 2019 e 2022, o uso de agrotóxicos foi a causa direta da morte de 439 brasileiros, além da intoxicação de 14 mil pessoas.

—Esses dados trágicos também trazem a marca do racismo estrutural, pois a maioria das vítimas são negras — lamentou.

Prejuízos à saúde

O presidente da CDH citou ainda estudos científicos internacionais tratando do impacto do uso de agrotóxicos sobre a saúde humana.

—Os estudos associam o uso de agrotóxicos ao desenvolvimento de tipos de câncer, como a leucemia e outros, e o Mal de Parkinson. Também é associado ao surgimento de lesões no fígado, pele e pulmões, além de desequilíbrios hormonais e mentais. Mas além desses impactos à saúde, também devemos mencionar os impactos ambientais do uso indiscriminado de agrotóxicos na água, ar e solo— alertou.

A procuradora do Ministério Público Federal (MPF), Ana Paula Medeiros, mostrou levantamento recente da Anvisa que associa a exposição constante aos agrotóxicos com problemas como impotência, abortos, insônia e depressão. Ela mostrou que o levantamento da Anvisa também corrobora os alertas de Paim quanto à exposição constante aos agrotóxicos.

— O estudo associa a exposição prolongada a agrotóxicos com problemas respiratórios graves, problemas no fígado e rins, além da anormalidade na produção de hormônios da próstata, ovários e tireoide. A Anvisa ainda alerta para o potencial carcinogênico e a problemas no desenvolvimento intelectual e físico de crianças—apontou.

A procuradora também apresentou dados do Ministério da Saúde, comprovando que o aumento de casos de intoxicação entre 2007 e 2015 acompanharam o uso mais disseminado de agrotóxicos. Durante o debate, a representante do Ministério da Saúde, Maria Juliana Corrêa, apoiou a proposta de uma taxação especial sobre os agrotóxicos.

Benefícios fiscais

A procuradora considera “contraditório” os agrotóxicos contarem com importantes benefícios fiscais, levando-se em conta seu potencial impacto à saúde. Os agrotóxicos contam hoje, segundo ela, com redução de 60% na base de cálculo do ICMS nas operações interestaduais, além da isenção em operações internas. Acrescentou que são isentos de Cofins e PIS/Pasep, além de contarem com a mesma alíquota zero no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e no Imposto de Importação [para os agrotóxicos listados].

— Esses incentivos contrariam as metas que o Brasil assumiu junto à Agenda 2030 da ONU, como alerta o TCU [Tribunal de Contas da União]. Uma tributação justa dos agrotóxicos geraria em médio prazo uma redução no uso desses produtos. O atual sistema tributário não diferencia os agrotóxicos pelo grau de toxicidade e de periculosidade ao meio ambiente. E a atual proposta de reforma tributária não evolui visando a adoção de alternativas menos nocivas. Na verdade, a PEC 45/19 abre caminho para a desoneração dos agrotóxicos por lei complementar —advertiu a procuradora.

A representante da ONG ACT Promoção da Saúde, Paula Johns, defendeu que o Guia Alimentar da População Brasileira [do Ministério da Saúde] seja o orientador da política tributária de alimentos e bebidas.

—O atual modelo tributário não favorece a alimentação saudável. Precisamos alimentar e não adoecer a população. Hoje alimentos ultraprocessados como  macarrão instantâneo, nuggets e néctar de frutas têm isenção de IPI. Já o suco de uva orgânico paga quatro vezes mais tributos que um néctar de uva ultraprocessado—comparou.

A ativista pede que o Senado aprove a adoção de um imposto seletivo sobre produtos não saudáveis no bojo da reforma tributária. Este imposto deve incidir, segundo ela, sobre tabacos, álcool, ultraprocessados e agrotóxicos. Esse “imposto do veneno”, como às vezes é chamado, também foi defendido por Marcelo Porto, que representou a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Os especialistas fizeram questão de reforçar que o “imposto do veneno” também tem apoio oficial do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

O representante do MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra],Diego Moreira, também reclamou do tratamento privilegiado que recebem os agrotóxicos, quando comparado a outras políticas alimentares.

— Só em 2021, o Brasil deixou de arrecadar R$ 13 bilhões com as isenções sobre agrotóxicos. Já o orçamento do PAA 2023 [Programa de Aquisição de Alimentos] destinado à agricultura familiar é de R$ 250 milhões—avaliou.

Apoio político e da população

De acordo com Paula Johns, pesquisa do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS) indicou que 52,5% dos brasileiros pesquisados apoiam a taxação especial sobre agrotóxicos. Ela citou um levantamento recente do site Congresso em Foco indicando que a maioria dos parlamentares apoiam, no âmbito da reforma tributária, mudanças em políticas que hoje beneficiam agrotóxicos.

—Dos parlamentares consultados, 63,6% defendem a vedação de benefícios fiscais a produtos prejudiciais à saúde. E 71,2% defendem que o “imposto do veneno” seja direcionado ao reforço orçamentário da Saúde — informou.

Ela acrescentou que pesquisa recente do Datafolha sinalizou o apoio da população a uma taxação maior sobre os agrotóxicos. O produto foi o terceiro mais citado, perdendo apenas para o tabaco e o álcool, entre a lista dos que deveriam ser mais taxados.

Discrepâncias tributárias

O presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), deputado estadual Marcos Abreu (Psol-SC), foi outro que se valeu de uma série de dados oficiais para criticar o atual modelo tributário.

Ele citou dados da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017 mostrando que, naquele ano, os estados deixaram de arrecadar R$ 10 bilhões devido às isenções fiscais sobre agrotóxicos. O valor, acrescentou, foi quase três vezes superior ao orçamento do Ministério do Meio Ambiente naquele ano (R$ 3,4 bilhões). Além disso, continuou, dados do próprio governo indicaram que de 2005 a 2019 o BNDES injetou R$ 749 milhões em 18 fabricantes de agrotóxicos, incluindo Monsanto, Syngenta, Ourofino e Dow Agrosciences.

O parlamentar catarinense apresentou outros dados sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde.

—Entre 2010 e 2019, foram 45,7 mil atendimentos de intoxicações por agrotóxicos, sendo que desses atendidos 1,8 mil morreram. Estudo da revista Saúde Pública revela que para cada US$ 1 gasto com a compra desses produtos no Paraná, o SUS despende U$$ 1,28 com tratamento de intoxicações— informou.

O Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua) detectou, segundo ele, agrotóxicos na água potável de 2.300 cidades entre 2014 a 2017. O parlamentar refutou teses de que uma taxação maior nos agrotóxicos possa gerar inflação.

— O Censo Agropecuário indica que 420 mil pequenas propriedades da agricultura familiar, que produzem a maior parte dos alimentos consumidos pelos brasileiros, dizem gastar somente 1,6% das despesas com agrotóxicos. A agricultura familiar produz 70% do feijão nacional, 34% do arroz, 87% da mandioca, 46% do milho, 38% do café e 21% do trigo.

Sobre Nós

O Dinheirama é o melhor portal de conteúdo para você que precisa aprender finanças, mas nunca teve facilidade com os números.  Saiba Mais

Faça parte da nossa rede “O Melhor do Dinheirama”

Redes Sociais

© 2023 Dinheirama. Todos os direitos reservados.

O Dinheirama preza a qualidade da informação e atesta a apuração de todo o conteúdo produzido por sua equipe, ressaltando, no entanto, que não faz qualquer tipo de recomendação de investimento, não se responsabilizando por perdas, danos (diretos, indiretos e incidentais), custos e lucros cessantes.

O portal www.dinheirama.com é de propriedade do Grupo Primo.