O governo Lula desistiu da briga com os acionistas da Petrobras (PETR3; PETR4) e irá votar favoravelmente ao pagamento dos 100% dos dividendos extraordinários referentes ao resultado de 2023, aponta O Globo nesta sexta-feira (19).
Segundo a notícia, um dos fatores que dará força a essa possibilidade do pagamento dos R$ 43,9 bilhões foi o desempenho da Petrobras no primeiro trimestre, que deixou o caixa da estatal mais robusto.
Ou seja, menos de 50 dias após o governo criar uma crise na Petrobras vetando o pagamento, o mesmo vai apoiar uma proposta que é o oposto da que seus representantes no conselho de administração votaram, relata a nota.
“Acreditamos que este movimento seria benéfico para as ações de Petrobras, uma vez que a retenção integral dos proventos anunciada no quarto trimestre de 2023 trouxe dúvidas quanto à futura alocação estratégica de recursos da empresa e a perenidade das próximas distribuições”, apontam os analistas da Ativa Investimentos.
Segundo eles, a companhia tem condições de aliar os investimentos descritos no seu atual plano de investimentos com a distribuição integral destes dividendos e o destravamento dos valores atualmente reservados atua como um fator mitigador de riscos para a tese.
Lula versus o mercado
O presidente Lula chegou a dizer em 11 de março, durante entrevista ao SBT, que a estatal não tem de pensar apenas nos seus acionistas, defendendo que recursos destinados a dividendos sejam transformados em investimentos.
Lula disse que a petroleira tem de pensar nos 200 milhões de brasileiros “sócios” da empresa, e não pode ficar presa à “choradeira do mercado”.
“Se eu for atender apenas à choradeira do mercado, você não faz nada, porque o mercado, vou contar uma coisa para vocês, o mercado é um rinoceronte, um dinossauro voraz, ele quer tudo para ele e nada para o povo.”
“Será que o mercado não tem pena das pessoas que passam fome? Será que o mercado não tem pena de 735 milhões de pessoas que não têm o que comer? Será que o mercado não tem pena das pessoas que dormem na sarjeta no centro de São Paulo e no Rio de Janeiro? Será que o mercado não tem pena das meninas com 12 e 13 que vendem às vezes o corpo por causa de um prato de comida?”, disse o petista.
Segundo Lula, não é correto a Petrobras, que tinha que distribuir R$ 45 bilhões, querer pagar R$ 80 bilhões em dividendos.
A decisão caiu como uma bomba sobre a Faria Lima, coração financeiro do Brasil. Muitos analistas de investimentos, à época, recomendavam a compra das ações da estatal, apesar dos riscos de interferência política. A percepção de alguns mudou.
Os analistas do Santander Rodrigo Almeida e Eduardo Muniz, por exemplo, reduziram o preço-alvo para as ações de R$ 52 para R$ 47 e rebaixaram a recomendação para de compra para manutenção.
“Sem dividendos extraordinários, vemos a Petrobras negociando com um dividend yield de ~9%, o que está em grande parte em linha com os pares latino-americanos/europeus. Finalmente, vemos uma falta de catalisadores e acreditamos que a maioria dos investidores já incorpora pressupostos otimistas. Dessa forma, estamos reduzindo nosso preço-alvo (2024E) de R$ 52 para R$ 47 e rebaixando a recomendação para “Manutenção”.
Briga de puxa-sacos
As consequências da falta de dividendos extraordinários da Petrobras mudou o equilíbrio de forças em um cabo de guerra entre o CEO da empresa estatal e o ministro de Minas e Energia que controla o conselho de administração.
O presidente-executivo da Petrobras, Jean Paul Prates, viu sua proposta de dividendos extraordinários, amplamente esperada pelos acionistas, ser rejeitada na quinta-feira passada, bloqueada por membros do conselho nomeados pelo governo.
Embora Lula tenha escolhido Prates pessoalmente para o cargo na Petrobras, e o relacionamento entre eles tenha resistido a um primeiro ano difícil, o CEO percebeu que estava em desvantagem.
No fim de semana anterior ao anúncio, ele procurou o ministro da Fazenda Fernando Haddad, buscando “contrabalançar” a pressão de Alexandre Silveira e Rui Costa, de acordo com uma das fontes, que falou sob condição de anonimato.
A confiança de Lula em Haddad ajudou o ministro da Fazenda a aprovar novas regras orçamentárias e a lutar pela disciplina fiscal, apesar do fogo amigo da base política do presidente esquerdista. Um grande pagamento de dividendos extraordinários ao governo, o maior acionista da Petrobras, também ajudaria a equilibrar o orçamento federal.
Quando Lula, Prates e Silveira se reuniram novamente na segunda-feira para discutir os planos para a Petrobras, Haddad estava presente na reunião. Depois disso, tanto Haddad quanto Silveira repetiram as garantias do CEO de que o dinheiro reservado do lucro do ano passado seria eventualmente usado para os dividendos dos acionistas.
Alexandre Silveira
Talvez mais importante, Silveira disse que Haddad nomearia um membro do conselho da Petrobras em uma reunião de acionistas, diluindo a influência do ministro de Minas e Energia no conselho.
A medida marcou uma reversão em relação ao mês passado, quando fontes disseram que o governo estava planejando renomear seus seis membros do conselho da Petrobras, em um sinal da influência contínua de Silveira.
O ministro da Energia tem sido um crítico aberto da administração da Petrobras sob o comando de Prates, criticando o que ele chama de preços altos dos combustíveis e planos de investimento abaixo do esperado.
Essas críticas têm se alinhado frequentemente com a retórica do próprio Lula sobre a empresa estatal, que ele criticou por pagar dividendos excessivos durante o governo anterior.