O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, nesta quarta-feira (18), a possibilidade de que os acordos de não persecução penal (ANPPs) criados pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) sejam aplicados nas ações penais iniciadas antes do início da vigência da lei.
O acordo pode ser feito inclusive quando o réu já tiver sido condenado, desde que a sentença não tenha transitado em julgado (ou seja, ainda exista possibilidade de recurso).
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Nas investigações ou ações penais iniciadas a partir de agora, a proposta de acordo pode ser apresentada pelo Ministério Público mesmo após o oferecimento da denúncia.
Os limites da aplicação retroativa do ANPP estavam em discussão no Habeas Corpus 185.913/DF, sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes.
No caso concreto, um homem que havia sido condenado a um ano e 11 meses de reclusão por tráfico de drogas antes da entrada em vigor da lei pediu que o STF garantisse seu direito de assinar o acordo.
Segundo a tese firmada pelo Plenário, cabe ao membro do Ministério Público responsável pela ação avaliar o preenchimento dos requisitos para negociação e celebração do ANPP nas ações penais iniciadas antes da vigência da lei.
O acordo será analisado na instância em que o processo estiver, sem retorno a instâncias inferiores.
Crimes leves e sem violência – Introduzido no art. 28-A do Código de Processo Penal pelo Pacote Anticrime, o acordo de não persecução penal pode ser feito em casos de infração penal sem violência ou grave ameaça e cuja pena mínima seja inferior a quatro anos.
O ANPP não se aplica a crimes hediondos ou graves, como homicídios e estupros, por exemplo.
Também não pode ser firmado quando o réu é reincidente; se houver provas de que a conduta criminosa é habitual, reiterada ou profissional; se a pessoa tiver se beneficiado de acordo semelhante nos cinco anos anteriores; e nos casos de violência doméstica, familiar ou contra a mulher.
Ao firmar o acordo, o acusado confessa a infração e se compromete a cumprir as cláusulas, que podem incluir a devolução do produto do crime às vítimas, quando isso for possível, a prestação serviço comunitário, o pagamento de multa ou cumprimento, por prazo determinado, de outra condição imposta pelo Ministério Público.
Desde janeiro de 2020, com a entrada em vigor da lei, até agosto de 2024, o MPF celebrou um total de 17.853 acordos de não persecução penal em processos na primeira instância, segundo dados da Câmara Criminal (2CCR).
O ANPP vem sendo cada vez mais utilizado porque agiliza procedimentos e dá resolução célere a casos que envolvem infrações leves, sem deixar de punir os crimes.
Como evita a instauração do processo criminal, o acordo desafoga a Justiça e permite que o Ministério Público concentre esforços na investigação e repressão de condutas mais graves, complexas e de maior impacto social.
O acordo também é benéfico para o infrator, uma vez que o signatário deixa de responder a processo criminal, permanece primário e sem antecedentes.
No âmbito do MPF, a ferramenta tem sido adotada em casos envolvendo ilícitos como contrabando ou descaminho, estelionato majorado, uso de documento falso, moeda falsa e crimes contra o meio ambiente.
Levantamento produzido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a pedido do STF mostra que quase 1,7 milhão de ações penais podem ser afetadas pela decisão que garantiu retroatividade aos ANPP.
Na primeira instância do Judiciário, 1.573.923 processos iniciados antes da entrada em vigor da lei se enquadram nos requisitos do acordo e ainda aguardam sentença.
Há ainda 101 mil processos na segunda instância do Judiciário e 20.117 processos tramitando perante os Tribunais Superiores.