A tributação sobre importação de turbinas para geração de energia eólica instituída pelo governo foi comemorada por fabricantes domésticas como um primeiro passo para fortalecer uma indústria que é considerada estratégica e vinha passando por dificuldades nos últimos anos, com a suspensão de operações de grandes empresas no país.
A expectativa entre fabricantes e especialistas é de que a máquina produzida internamente volte a ser mais competitiva frente à importada, ajudando a frear o movimento recente de maior importação de equipamentos no setor. Geradores, contudo, chamaram a atenção para possíveis aumentos de custos dos projetos.
O Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Gecex-Camex) anunciou no fim de dezembro mudanças na tributação sobre importações de painéis solares e aerogeradores, visando fortalecer a produção nacional de equipamentos para geração de energia renovável.
A medida, que fixa uma alíquota de 11,2% de imposto de importação para todas as compras externas de turbinas eólicas a partir de 2025, vem em uma conjuntura desfavorável para as fabricantes instaladas no país.
A repercussão da medida entre o setor eólico foi distinta da vista na cadeia de energia solar, que é fortemente dependente de importações. A retomada das tarifas de importação para painéis foi comemorada pela indústria elétrica e eletrônica, mas criticada pela Absolar, que representa geradores, fabricantes e outros players do segmento, que disse ver um impacto em 18 GW de projetos da fonte.
A indústria eólica, já bem consolidada no Brasil, enfrentou turbulências nos últimos anos, com disrupção nas cadeias de fornecimento aliada a uma pressão por mais entregas. Diante das dificuldades, duas gigantes mundiais, GE e Siemens Gamesa, interromperam suas atividades no país.
Segundo a associação de energia eólica ABEEólica, a medida do governo “corrige assimetrias”, uma vez que antes as empresas não pagavam imposto para importar máquinas inteiras, mas eram tributadas na compra de componentes para sua produção local.
“Estamos colocando as coisas em pé de igualdade”, disse Elbia Gannoum, presidente da entidade, ressaltando que este é apenas o primeiro passo de uma política industrial mais ampla e que deve envolver outras ações para uma “neoindustrialização”.
Ela ressaltou ainda que o Brasil vem batendo recordes no setor eólico, tendo instalado 4,8 gigawatts (GW) em aerogeradores em 2023, apesar do contexto mais desafiador para o desenvolvimento de novos projetos em virtude da sobreoferta de energia no país.
“Em uma fotografia de curtíssimo prazo, vemos uma demanda mais baixa, mas o cenário é outro no médio e longo prazo”, ressaltou a presidente da ABEEólica.
Para a fabricante dinamarquesa Vestas, a medida garante isonomia competitiva e é uma sinalização importante de que o Brasil quer desenvolver uma base industrial para o setor no momento em que grandes potências fazem o mesmo para depender menos de importações na transição energética.
“O Brasil já se mostrou muito competitivo… É importante que essa indústria permaneça não apenas viva, mas consistente e também se expanda, porque o Brasil pode se tornar um hub de exportação de aerogeradores para a América Latina e para outros mercados”, avaliou Leonardo Euler, vice-presidente de Assuntos Regulatórios e Governamentais da Vestas para América Latina.
O executivo afirmou ainda que a decisão foi importante para a companhia, que tem fábrica em Aquiraz (CE), reforçar seus planos de expansão, mas não entrou em detalhes. Na véspera, a Vestas anunciou uma extensão de seu contrato com a produtora brasileira de pás Aeris para até 2028.
Aumento de Custos
Apesar da animação na indústria, a medida tributária, que também abrangeu equipamentos de energia solar, foi vista com preocupação por geradores, que dizem ver potencial aumento dos custos de novos projetos renováveis.
O CEO da AES Brasil, Rogério Pereira Jorge, avaliou que a tributação, isoladamente, não é eficaz e pode até mesmo atrapalhar os planos de atrair ao país indústrias que buscam descarbonizar suas operações, uma vez que o custo da energia renovável tenderia a subir.
“Minha maior preocupação é que a energia renovável tem sido o maior fator de competitividade do Brasil para atração de indústrias”, disse o executivo, citando como exemplo a decisão da Alcoa de retomar sua produção de alumínio no país.
“A gente vê um movimento de produtores globais, tanto da parte solar quanto da eólica, de vir para o Brasil. Mas também vemos o contrário, de sair do Brasil… Sinal que não é uma questão do imposto de importação exclusivamente que impacta nessa tomada de decisão”, acrescentou Jorge.
A gerente de assuntos regulatórios da AES, Francine Martins Pisni, observou que há incerteza em relação a contratos de fornecimento de máquinas já fechados, uma vez que o imposto de importação é cobrado quando a mercadoria chega no porto.
“Na prática, não houve um período de transição para a eólica, todo mundo que tem algum contrato de venda com certeza vai ter esse imposto de importação cobrado.”
Camila Ramos, fundadora da consultoria Clean Energy Latin America (CELA), avalia que a taxação acaba nivelando o fornecimento de equipamentos pelo custo mais alto.
“Acredito que seria interessante para o país ter políticas para incentivar a produção local a ser mais competitiva, como desoneração fiscal, e não fazer a importação mais cara”, disse Ramos.
Gannoum, da ABEEólica, nega que os projetos de energia eólica podem encarecer após a medida tributária. “(A importação) não tem participação tão relevante assim, não é um efeito central”, disse ela, que não tinha dados sobre o total de equipamentos importados pelo setor.