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Bets vão acabar no Brasil? Pressão cresce com pedido no STF

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) registrou uma ação no Supremo pedindo o fim da operação dos cassinos online

por Gustavo Kahil
3 min leitura
Apostas Bets

A pressão sobre o mercado de apostas online (Bets) tem crescido nos últimos meses com diversos dados revelando os impactos sociais e econômicos do setor sobre a renda e endividamento dos brasileiros. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) registrou nesta terça-feira (24) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo o fim da operação dos cassinos online.

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A ação (veja a íntegra abaixo) contesta a Lei 14.790/2023, conhecida como “Lei das Bets”, sob o argumento de que a legislação que regulamenta as apostas de cota fixa no Brasil “está causando graves impactos sociais e econômicos”.

“A confederação solicita, em caráter liminar, que o STF suspenda a eficácia da lei até que o mérito da questão seja julgado, a fim de evitar maiores danos ao comércio e à economia do país”, declarou a CNC, em nota distribuída à imprensa nesta quarta-feira, 25.

A CNC encaminhou também na terça um ofício ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que manifesta “grande preocupação com o crescimento descontrolado” das apostas on-line no Brasil, em especial dos cassinos virtuais. O documento foi entregue ainda aos ministérios da Fazenda, da Justiça e do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, além dos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados.

Na ação no STF, a CNC argumenta que “a disseminação desenfreada das apostas on-line estaria criando um ciclo de dependência, principalmente entre os mais vulneráveis, o que tem levado à redução do consumo de bens essenciais e afetado diretamente o comércio”.

Segundo a entidade, a lei não estabelece medidas eficazes para combater o vício em jogos, o que contribuiria para agravar o nível de endividamento das famílias.

“A CNC pede que a lei seja declarada inconstitucional, apontando violações aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da ordem econômica e da proteção à saúde”, comunicou a entidade.

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Bets e a inadimplência

A CNC divulgou na última sexta-feira, 20, um estudo mostrando que mais de 1,3 milhão de brasileiros teriam ficado inadimplentes no primeiro semestre de 2024 devido a apostas em cassinos on-line.

A entidade afirma que os apostadores têm usado “sem controle” cartão de crédito nessas plataformas de jogos, o que contribui para um aumento das contas em atraso. Os brasileiros já gastaram R$ 68 bilhões em jogos entre junho de 2023 e junho de 2024, o equivalente a 0,62% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, apontou a CNC.

O montante revela que 22% da renda disponível das famílias foram destinados às apostas no último ano, “gerando uma série de consequências econômicas e sociais”, alertou a entidade.

Bolsa Família ameaçado

Parte dos recursos dos programas sociais está indo parar nas casas de apostas. Segundo nota técnica elaborada pelo Banco Central (BC), os beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em bets (empresas de apostas eletrônicas) via Pix em agosto.

Segundo a análise técnica do BC, cerca de 5 milhões de beneficiários de um total aproximado de 20 milhões fizeram apostas via Pix.

O gasto médio ficou em R$ 100. Dos 5 milhões de apostadores, 70% são chefes de família e enviaram, apenas em agosto, R$ 2 bilhões às bets (67% do total de R$ 3 bilhões).

O relatório inclui tanto as apostas em eventos esportivos como jogos em cassinos virtuais.

O volume apostado pelos beneficiários do Bolsa Família pode ser maior. Os dados do BC incluem apenas as apostas via Pix, não outros meios de pagamento como cartões de débito e de crédito e transferência eletrônica direta (TED).

O levantamento, no entanto, só registrou os valores enviados às casas de apostas, não os eventuais prêmios recebidos.

O BC também estimou o valor mensal gasto via Pix pela população em apostas eletrônicas. O volume mensal de transferências para bets variou entre R$ 18 bilhões e R$ 21 bilhões.

Somente em agosto, o gasto somou R$ 20,8 bilhões, mais de dez vezes o R$ 1,9 bilhão arrecadado pelas loterias oficiais da Caixa Econômica Federal.

Em agosto, o Bolsa Família pagou R$ 14,12 bilhões a 20,76 milhões de beneficiários. O valor médio do benefício no mês ficou em R$ 681,09.

Propagandas proibidas

Um projeto de lei que tramita no Senado pode proibir a publicidade, o patrocínio e a promoção de apostas de quota fixa e jogos on-line, bem como apostas relacionadas a resultados de eleições.

PL 3.563/2024 tem objetivo de frear o alcance das propagandas relacionadas a apostas, a fim de diminuir danos à saúde mental e ao patrimônio causados pelo vício em betse jogos on-line, argumenta o autor da proposta, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP).  

O PL 3.563/2024 altera as leis que regulamentam apostas esportivas on-line (Leis 13.756, de 2018, e 14.790, de 2023). Entre as principais mudanças, estão a proibição da exploração comercial de apostas em eleições e a vedação de qualquer forma de publicidade sobre apostas em mídias como rádio, televisão, internet e redes sociais. Também está prevista a proibição da pré-instalação de aplicativos de apostas em dispositivos eletrônicos. 

De acordo com o senador, a inércia das gestões anteriores em regulamentar as apostas (autorizadas no Brasil desde 2018) criou uma situação de “distorção legal”. “Sem a devida regulamentação por cinco anos, somente neste ano, após a aprovação da Lei 14.790, de 2023, por meio de um projeto de iniciativa da Presidência da República, foi possível elaborar as normas infralegais que agora irão balizar esse mercado de apostas esportivas e jogos on-line”, afirma. 

Apoio de Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou preocupação, nesta terça-feira (24) com a regulação de jogos de azar e bets no Brasil e disse que pessoas pobres estão se endividando em apostas online. Contudo, em junho, ele defendia a aprovação dos cassinos: “Eu não acredito no discurso de que ‘se tiver cassino o pobre vai gastar tudo que tem”.

“Houve um tempo em que esse discurso sobre jogos de azar tinha alguma verdade. De todos os jogos que acontecem, eu sempre achei que o jogo do bicho era o jogo que mais distribuía a dinheiro, porque o cara ganha R$ 50, R$ 40, R$ 30. Isso é considerado contravenção, é proibido. Jogar baralho, jogar poker, apostar dinheiro é proibido, fazer cassino é proibido. Mas é jogatina que você tem hoje na televisão, no esporte? Criança com celular na mão, fazendo aposta o dia inteiro. Quem é que segura isso?”, questionou.

“O pobre não vai no cassino, o pobre vai trabalhar no cassino, ele pode até ver a sua cidade se desenvolver, mas ele não vai porque o cassino é uma coisa pra gente que tem dinheiro”, acrescentou o presidente.

O senador Eduardo Girão (Novo-CE), em pronunciamento no Plenário nesta terça-feira (24), criticou a regulamentação das apostas esportivas por meio de medida provisória aprovada no ano passado (MP 1.182/2023). Segundo ele, a matéria “facilitou a entrada do crime organizado no setor”. Ele citou investigações envolvendo facções criminosas como o PCC e o Comando Vermelho.

Em seu discurso, o parlamentar alertou também para os riscos ligados à dependência do jogo. De acordo com Girão, países onde as apostas foram legalizadas registram que até 5% da população é viciada. Pelos cálculos dele, no Brasil poderia significar 10 milhões de pessoas afetadas. Para o senador, a compulsão pelo jogo tem levado ao aumento da criminalidade e ao suicídio.

“Depois do vício, depois de perder tudo, desde bens materiais até o emprego, o desespero provocado pelas enormes dívidas e pela vergonha têm levado milhões de pessoas ao suicídio. Artigo publicado pelo The New York Times mostra que entre 50% e 80% dos ludopatas já pensaram em suicídio e entre 13% e 20% já tentaram efetivamente ou já se mataram”, ressaltou.

Girão também pediu o apoio dos colegas para rejeitar o projeto de lei (PL 2.234/2022), que autoriza a instalação de bingos e cassinos no Brasil. Ele argumentou que o projeto, aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), “causará danos econômicos e sociais ao país”.

(Com Agência Senado, Agência Brasil e Estadão Conteúdo)

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