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Com economia mundial em risco, EUA buscam ampliar teto da dívida pública

por André Salmeron
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dívida pública dos EUA

É muito comum, no mercado financeiro, dizermos que não há nenhum investimento mais seguro do que aqueles oferecidos pelo tesouro dos EUA, maior economia do mundo. Entretanto, esse cenário pode estar mudando, conforme o país luta para aprovar um novo aumento do seu teto da dívida pública. Se isso não acontecer ao longo das próximas semanas, um atraso no pagamento dos títulos não está fora de cogitação.

O impacto de um default – ou calote, em português corrente – seria algo inédito na história do país e tenderia a jogar a economia dos EUA em uma recessão. Além disso, como esses títulos estão na base do sistema financeiro mundial, os impactos seriam sentidos em todas as partes do mundo.

Contextualizando o problema da dívida pública dos EUA

Segundo a Secretaria do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, existe a chance de os atrasos no pagamento de títulos começarem já no dia primeiro de junho (01/06), caso a situação não seja rapidamente resolvida pelo Congresso. No caso, ambas as casas (Câmara e Senado) precisam aprovar um aumento no teto de dívida dos EUA, pois sem essa medida o governo fica, na prática, proibido de tomar novos empréstimos e se torna incapaz de pagar suas dívidas.

Acontece que a negociação para aprovar esse aumento no teto da dívida é extremamente complexa, com a Câmara sendo liderada por uma maioria do Partido Republicana e o Senado por uma maioria do Partido Democrata. Ao passo que Democratas e a Casa Branca exigem um aumento “limpo”, sem a necessidade de cortes no orçamento, o partido Republicano demanda cortes profundos em itens como saúde pública e assistência social.

A situação torna- se ainda mais complicada ao considerar que Kevin McCarthy, atual líder da Câmara, precisa lidar com um partido dividido e povoado por figuras pouco abertas à negociação. 

Basta lembrar que, para ser eleito líder pelo próprio partido, ele foi derrotado em 14 rodadas (como candidato único) antes de conseguir os votos da ala mais extremista do partido, sendo eleito na décima quinta. Nunca na história foi necessário mais do que uma rodada para eleger a liderança da Câmara. 

Em 26 de abril, o Partido Republicano conseguiu aprovar uma lei que propõe um aumento da dívida, mas exige cortes bastante profundos nos gastos do governo dos EUA. Dentre os pontos mais sensíveis, ficaria imposto um aumento possível de apenas 1% ao ano pela próxima década, bem abaixo do valor médio da inflação no país. Cortes em auxílio estudantil, programas contra a fome e no equivalente da Receita Federal (IRS) são outros destaques.

Essa lei, no entanto, é considerada inútil visto que o Senado não irá aprová-la e que o presidente, Joe Biden, pode vetá-la. Contudo, a lei é considerada um ponto inicial para a retomada das negociações, que estão estagnadas desde fevereiro de 2023 quando McCarthy e Biden se reuniram pela última vez para tentar dar cabo do problema.

O que é o teto da dívida dos EUA?

O Tesouro dos EUA só está autorizado a assumir mais dívidas sob autorização expressa do Congresso, e esse limite é o que chamamos de teto da dívida. Caso um aumento não seja autorizado, o Departamento do Tesouro ficaria, na prática, impedido de cumprir suas obrigações financeiras, que incluem o pagamento dos títulos do tesouro. 

Esse limite foi atingido em janeiro de 2023 e, desde então, o Tesouro vem utilizando aquilo que sua secretária, Janet Yellen, chamou de “medidas extraordinárias” para manter o governo em funcionamento. Na prática, tratam-se de manobras contábeis que visam abrir espaço para o pagamento das principais contas do país.

Entretanto, na segunda (01/05), ela reforçou em comunicado ao Congresso que a capacidade de honrar as dívidas pode terminar em uma data tão próxima quanto o primeiro de junho (01/06). Outras estimativas consideram que um possível calote (atraso) tende a chegar no final de junho ou início de julho de 2023. Na medida em que a negociação segue indefinida, o mercado mundial se prepara para uma possível tempestade à frente. 

Um histórico problemático

Embora o sistema financeiro dos EUA esteja no centro da economia mundial, não é a primeira vez que o teto da dívida vira fonte de problemas. Embora os Republicanos tenham aprovado três aumentos durante a presidência de Trump, membro do partido, sem levantar qualquer problema, as coisas mudaram diante de uma Casa Branca e Senado com maioria de Democratas.

Em 2011, durante a presidência de Barack Obama (Democrata), o partido Republicano novamente ganhou controle da Câmara e fez uma série de exigências para aprovar o aumento no teto da dívida. As negociações se arrastaram ao ponto de só serem resolvidas quando faltavam dois dias para o calote na dívida, com a aprovação de uma lei que determinava cortes nos gastos do governo ao longo dos próximos anos.

A disputa entre os dois partidos inclusive levou a uma redução na nota de crédito dos EUA pela agência de risco Standard & Poor’s, algo inédito na história do país. Posteriormente, em 2013, uma nova crise relacionada ao teto de dívida foi instaurada, com o partido Republicano exigindo cortes no programa de saúde pública criado por Barack Obama, coloquialmente conhecido como Obamacare – com a crise sendo resolvida em 2014.

Medidas inusitadas ganham força

Conforme os EUA tentam lidar com a nova crise no teto da dívida, especialistas começam a levantar medidas inusitadas para tentarem contornar o eventual calote. Uma das mais radicais envolve uma margem legal que permitiria que o Departamento do Tesouro produzisse uma moeda de um trilhão de dólares, que seria então depositada com o Federal Reserve (Banco Central dos EUA) e o governo poderia usar esse dinheiro até que um aumento fosse aprovado.

Embora a medida seja considerada absurda, diversos economistas – incluindo Paul Krugman, vencedor do Nobel de Economia – consideram que ela seja uma solução mais viável do que um calote. Entretanto, ao que tudo indica, Janet Yellen não se mostra nem um pouco favorável a essa solução – que, no mínimo, colocaria os EUA numa situação muito delicada.

Outra proposta inusitada envolve utilizar um artigo da 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos, publicada após o fim da Guerra Civil, entre 1861 e 1865. No caso, o artigo determina que “a validade da dívida pública dos Estados Unidos… não deverá ser questionada.” A medida visava impedir estados individuais de repudiar sua própria dívida, algo que havia sido feito por alguns daqueles que pertenciam aos Estados Confederados.

Segundo alguns historiadores, como Michael Dorf, da Cornell University, isso significa que Joe Biden estaria autorizado a passar por cima do Congresso em relação ao teto da dívida, autorizando o Departamento do Tesouro a realizar novos empréstimos e proteger a dívida dos EUA. Isso definitivamente resultaria em um processo contra a medida, embora não seja claro quem poderia dar entrada nesse processo – trata-se de uma zona cinzenta legal.

A última vez que o uso da 14ª Emenda foi levantado para resolver o impasse do teto da dívida foi precisamente nas duas últimas crises anteriores, em 2011 e 2013. Democratas de grande peso, como o ex-presidente Bill Clinton, defenderam a ideia, mas a equipe do então presidente, Barack Obama, não acreditou ter o poder legal de levar a medida adiante.

Qual o tamanho da dívida dos EUA?

A dívida dos EUA é uma das maiores do planeta, em linha com o fato de que títulos do seu tesouro nacional estão na base do sistema financeiro mundial e o dólar é usado em virtualmente todas as negociações. Atualmente, ela está em torno de US$31 trilhões e representa 123% do PIB do país. 

Para se ter noção, a dívida do Brasil representa cerca de 72% do PIB nacional, chegando a um valor de R$5,76 trilhões ou cerca de US$1,1 trilhões. Essa proporção Dívida/PIB está em linha com regiões como a União Europeia (85%) e Canadá (71%), além de muito abaixo da de países como França (113%) ou Itália (144%).

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